‘Meu irmão jamais se mataria, ele tem uma filha ‘, diz irmão de homem encontrado em cela

       Para Jorge Gomes, 36 anos, a morte do irmão Marcos Vinícius Gouvea Gomes, de 33 anos, nesta quinta-feira, em uma cela da 32ª DP (Taquara), na Zona Oeste do Rio, ainda precisa ser esclarecida. A versão da polícia é de que ele teria se enforcado com a própria camisa na janela. Marcos foi enterrado neste domingo no cemitério do Caju, Zona Portuária do Rio.
“Até agora não nos entregaram a camisa que disseram que ele usou para se enforcar. Também não passaram o protocolo do atendimento do SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), que eles relataram ter solicitado, e não nos passaram o depoimento do jovem que dividia a cela com ele naquele dia. Tudo muito estranho”, comenta Jorge, que mora em São Paulo e estava no trabalho quando recebeu a notícia.

Outro ponto que intriga a família foi o fato de o corpo ter dado entrada no IML com a especificação de “morte domiciliar”. “Só depois da contestação eles modificaram o documento”, diz. Jorge confirma que o irmão vinha sofrendo com a dependência química e alcoolismo havia alguns anos. Ele tinha sido internado por 40 dias em uma clínica em Guapimirim no Estado do Rio, tendo sido liberado no dia 21 de agosto.

“Existe uma série de coisas que aconteceram ao longo desses últimos dias que para nós não foram esclarecidas. Estão todos muito incomodados, inquietos. Meu irmão foi parar na delegacia por causa de uma briga de trânsito e por não ter pago  10  reais num posto de gasolina. Saiu de lá morto menos de 12 horas depois”.
Jorge reclama da ausência do Estado. “Não tivemos nenhum contato sobre meu irmão ainda”. E aponta outras falhas da polícia. “O primeiro ponto foi que não houve um contato da delegacia com a família quando foi preso. Meu pai descobriu que ele estava na 32ª DP porque alguém mandou uma mensagem pelo Insta gram  para a mulher com quem ele tinha passado a noite”.
Sobre a roupa que Marcos usava no dia da sua morte, comenta: “Não sabemos se a camisa era realmente dele. Minha irmã que morava com ele conhece todas as roupas, queremos ver que camisa é essa. Nós queremos um posicionamento. A delegacia se limitou a dizer que não ia se manifestar e que seria aberto inquérito para apurar os fatos. Como um cidadão sobre    custódia do Estado, que era dependente químico, foi deixado sem contato com a família e sem o remédio que ele precisava tomar?”.
Com relação à versão do suicídio, Jorge declara: “Fiquei muito nervoso com a notícia. Comecei a me preparar para vir para o Rio quando me acalmei, coloquei a cabeça no lugar e a comecei pensar sobre esta versão. Meu irmão jamais se mataria, ele tem uma filha de 3 anos que é o amor da vida dele. Mesmo que estivesse sobre efeito de drogas, se por um segundo passasse o suicídio pela cabeça dele, ele se lembraria da filha e não faria. Como pode ter decidido cometer este ato tão drástico em tão pouco tempo?”.
Falha na comunicação
Jorge lembra que o pai chegou na delegacia às 15h de quinta-feira e já havia sido expedida a fiança. Porém, ele não foi avisado de que havia essa opção. Informaram apenas que Marcos seria levado junto com outros presos para Benfica, no dia seguinte, quando haveria uma audiência para definir se ele ia ser solto ou não.
Um amigo do rapaz contratou, então, um advogado, que se deslocou para Benfica na manhã de sexta, ocasião em que aproveitou para levar um medicamento para Marcos. “Chegavam vários detentos, menos o meu irmão. Foi quando o advogado soube da morte dele”.
Marcos morava com os pais e uma irmã. A filha de 3 anos vivia com a mãe. “Ele e a companheira moraram juntos porém a dependência química acabou causando problemas, aí ele voltou a morar com meus pais. Mas estava sempre com a filha, ia buscá-la várias vezes por semana”.
Jorge comenta também o comportamento do irmão no momento em que foi abordado pela polícia no posto de gasolina. “Eu acho possível que ele tenha consumido drogas aquele dia sim, a gente sabe que quem sofre com essa doença pode ter recaídas. Mas não faz sentido que em menos de 12 horas um rapaz jovem e forte apareça enforcado numa cela. Não tem uma foto da cena, não tem informação sobre a altura da janela. Meu irmão tinha mais de 1,80m”.
Providências
A família de Marcos busca informação. “Queremos detalhes. Cadê o depoimento do preso que estava dividindo a cela com ele? Muito estranho ele estar dormindo às 20h30 e não ter ouvido nada. Meu irmão tinha 95 quilos, ele teria ouvido algum barulho. Este rapaz é uma testemunha importante”, indigna-se Jorge, acrescentando que o mesmo advogado que ia cuidar da soltura do irmão está tratando desses desdobramentos.
“Eles acharam que a família ia deixar de lado mas queremos explicações. A impressão é de que se não tivéssemos feito nada o atestado de óbito dele teria sido identificado com morte domiciliar. Acharam que ele era um bicho que não tinha família”.
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