Morre Tarcísio Meira, aos 85 anos, por complicações da Covid-19

Um dos grandes galãs de todos os tempos, Tarcísio Meira, que morreu nesta quinta-feira, dia 12, aos 85 anos, é dono de uma história que se mistura à da TV brasileira. Ao lado da mulher, Glória Menezes, foi protagonista da primeira telenovela diária do país, “2-5499 — Ocupado”, na Excelsior, em 1963. Em 1968, o casal inaugurou a faixa das oito da Globo com “Sangue e areia”. Ao longo da carreira, atuou em mais de 60 trabalhos, entre novelas, minisséries e especiais. Seu último trabalho na TV Globo foi a novela “Orgulho e paixão”.

Tarcísio Magalhães Sobrinho nasceu no dia 5 de outubro de 1935, em São Paulo. O sobrenome Meira veio “emprestado” da mãe, Maria do Rosário Meira Jáio de Magalhães, por ser mais sonoro artisticamente e por trezes letras, uma superstição do jovem na época. Seu primeiro sonho profissional foi ingressar no Instituto Rio Branco para se tornar diplomata. Ao ser reprovado na primeira prova, em 1957, desistiu da ideia e acabou investindo definitivamente na carreira de ator.
Amor, teatro e TV

No mesmo ano em que não passou na prova do Instituto Rio Branco, Tarcísio estrelou peças como “Chá e simpatia”, de Robert Anderson, e “Quando as paredes falam”, de Ferencz Molnar. Em 1959, dividiu o palco com Sérgio Cardoso em “Soldado Tanaka”, de George Kaiser. Em 1960, ainda no teatro, o jovem de 25 anos e 1,85m viu Glória pela primeira vez.

— Estava ensaiando a peça “As feiticeiras de Salém”, dirigida por Antunes Filho, e, de repente, passou aquela coisinha linda. Eu falei: “O que é isso?” Um tempo depois, fomos chamados para fazer um teleteatro, “Uma Pires Camargo” (1961) e ficamos amigos — relembrou o ator, em entrevista ao GLOBO, em 2015, sobre a história de amor que se confunde com a da carreira. — Quando ela lançou o filme “O pagador de promessas” (1962) em Cannes, mandei flores e um cartão escrito “volte, volte, volte”.

Tarcísio e Glória viraram grandes estrelas da TV Excelsior, que os escolheu para protagonizar “2-5499 — Ocupado”. Depois, foram mais nove novelas até assinar com a TV Globo. Na emissora carioca, fez sua estreia, também com a mulher, em “Sangue e areia”, em 1967. Três anos depois, ele viveu um de seus personagens mais emblemáticos: João Coragem, de “Irmãos Coragem”, novela de Janete Clair, estrondoso sucesso da época. Segundo o site do projeto Memória Globo, a audiência do penúltimo capítulo foi maior que a da final da Copa do Mundo.

“Foi a primeira novela que os homens admitiam que viam. Até então, eles viam meio escondidos, porque novela era coisa de mulher”, explicou o ator ao site.

Em sua longa trajetória na TV, o paulistano na TV viveu personagens inesquecíveis como Antônio Dias, em “Escalada” (1975), novela de Lauro César Muniz. Com Felipe, em “Guerra dos sexos” (1983), surpreendeu ao viver seu primeiro personagem cômico e protagonizou cenas impagavéis ao lado de Fernanda Torres e Paulo Autran. Renato Villar, em “Roda de Fogo” (1986), obra de Lauro César Muniz; Dom Jerônimo, na minissérie “A muralha” (2000), adaptação do livro de Dinah Silveira de Queiroz assinada por Maria Adelaide Amaral e João Emanuel Carneiro; Aristide, em “Páginas da vida” (2006), e Manoel Carlos; Tibério Vilar, no remake de “Saramandaia”, de Dias Gomes, feito por Ricardo Linhares (2013), foram outros personagens que marcaram sua carreira. Sua última novela foi “Orgulho e paixão”, escrita por Marcos Bernstein em 2018, em que interpretou Lorde Williamson.

Com Mazzaropi e Glauber

O ator não restringiu sua carreira à TV. Em 1963, fez seu primeiro filme, “Casinha pequenina”, um dos maiores sucessos da filmografia de Mazzaropi. No cinema foram mais de 20 produções, entre elas “A idade da pedra” (1981), último filme de Glauber Rocha e um dos mais complexos e reflexivos, com quatro personificações distintas da imagem de Cristo (um negro, um militar, um indígena e um guerrilheiro).

— Um dia, Glauber me botou no meio de uma bateria de escola de samba. De uma hora para outra, na batida da música, notei algo: o que era para ser uma escola de samba virou uma banda militar, quase que numa marcha. Era um tipo de cinema que eu nunca tinha feito — disse Tarcísio, em entrevista ao GLOBO em 2010.

No mesmo ano, o ator estrelou “O beijo no asfalto”, dirigido por Bruno Barreto e baseado na peça de Nelson Rodrigues. A obra deu o que falar na época já que o personagem de Tarcísio beijava o de Ney Latorraca na boca. O último longa do ator foi “Não se preocupe, nada vai dar certo!”, de Hugo Carvana, comédia lançada em 2011.

— Carvana me deu um personagem que chora de mentirinha, mas também é capaz de chorar de verdade. E com verdade. Cinema é isso: é ver, é acreditar e se emocionar — contou ele, em 2010.

No fim de 2019, Tarcísio subiu aos palcos pela última vez, com a reencenação de “O camareiro”, peça que estrelou em 2015 e lhe rendeu o prêmio Shell de melhor ator em 2016. Ao todo, foram 31 peças de teatro ao longo da vida, muitas delas com Glória, como “Tudo bem no ano que vem” (1976), “Toma lá,dá cá” (1983) e “E Continua tudo bem” (1996).

“O trabalho do ator é bonito e útil. Diz respeito à sensibilidade. Eu procuro desempenhá-lo da melhor maneira possível, com a máxima eficácia. Tento convencer as pessoas das verdades daquele personagem. Essa carreira me gratifica muito”, disse ele ao Memória Globo.

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