Disputa por clientes da Oi cresce no call center e também no Cade, com conflitos concorrenciais

Nos últimos dois meses, clientes da Oi vêm recebendo propostas de pacotes de internet e telefone fixo de TIM, Claro e Vivo. Na conversa, os atendentes explicam que a tele carioca foi comprada e sugerem a contratação de um novo combo que inclui oferta de celular por preços atraentes e maior velocidade de conexão.

Essa disputa pelos clientes da Oi traz mais uma polêmica em torno da venda da operação móvel da operadora para as três principais rivais do setor, um negócio de R$ 16,5 bilhões, que não inclui os serviços de internet e telefone fixos.

 

No Cade, órgão que regula a concorrência no país, a operação está em análise desde fevereiro e longe do fim. A expetativa é que o parecer saia entre o fim deste ano e o primeiro trimestre de 2022, de acordo com fontes do mercado. A concretização do negócio também depende do aval da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), onde o processo ainda está em fase de instrução.

Nessa altura dos acontecimentos, as ligações de telemarketing para os clientes da operadora carioca geraram mal-estar entre as empresas a ponto de TIM, Claro e Vivo receberem da Oi uma representação criticando a iniciativa, dizem fontes das empresas.

Nos bastidores, as operadoras argumentaram com a Oi que as chamadas foram feitas por empresas de telemarketing sem autorização. Isso porque os departamentos de marketing das teles fazem uma espécie de roteiro para o call center, que nem sempre seria seguido à risca.

 

Riscos da concentração

Oficialmente, Vivo, TIM e Claro dizem manter práticas comerciais legais e éticas. Já a Oi destaca que “o processo de alienação trata exclusivamente da sua operação móvel e ainda se encontra em fase de análise concorrencial e regulatória”. E acrescenta ainda não ter “qualquer acordo com as operadoras concorrentes para nenhum tipo de abordagem comercial de nenhuma natureza à sua base de clientes”, acrescentando que o setor é “altamente competitivo e pautado pelo respeito às práticas concorrenciais e regulatórias”.

Camila Leite Contri, pesquisadora de telecomunicações e direito digital do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), classifica esse episódio como “competição predatória”:

— É desleal e preocupante, pois induz o consumidor ao erro, já que sequer a compra da Oi foi legitimada ainda. Tememos que a venda da Oi móvel para essas três operadoras, com o consequente aumento de concentração desse mercado, perpetue os problemas de qualidade e de preço que já temos. Até porque a Oi era a que mantinha pacotes mais populares — destaca.

A competição pelos quase 15 milhões de clientes que têm serviços fixos da Oi ocorre em um momento em que Idec, concorrentes (como Algar e Sercomtel) e associações de companhias de telecom de menor porte (Telcomp e Neo) foram incluídos como partes interessadas no processo de venda da operação móvel da Oi pelo Cade. No fundo, o objetivo dessas instituições é desfazer o negócio para que haja uma nova oferta do serviço móvel da Oi.

— Se fizessem a oferta da Oi como se estruturou a do 5G, com regionalização, poderia dar oportunidade a pequenas e médias empresas ganharem musculatura e gerar mais competição. Claro que isso é bom para as empresas, mas certamente também é para o consumidor— diz Alex Jucius, diretor-geral da Neo, associação que reúne 200 empresas do setor.

A Neo apresentou ao Cade estudo que mostra o efeito do aumento da concentração de mercado sobre preço e qualidade assinado pelos economistas Camila Cabral Pires Alves, ex-economista-chefe Adjunta do Cade, Eduardo Pontual Ribeiro e Luiz Carlos Delorme Prado, ambos ex-conselheiros do Cade.

— Comparamos dados de países europeus em que houve esse processo de consolidação, de 2000 para cá, e nos quais isso não aconteceu. A conclusão é que nos países com mercado mais concentrado a queda de preços, natural nesse segmento pelo desenvolvimento da tecnologia, é mais lenta, assim como a melhora da qualidade — afirma Pontual.

Quem também foi ao Cade questionar o processo foi o Fórum 5G, uma inciativa que reúne cerca de 300 provedores de serviço de internet. Em carta enviada ao órgão, e obtida pelo GLOBO, eles dizem que “o poder econômico concentrado pelos grandes conglomerados internacionais estabelecidos no Brasil representa um retrocesso na competição, concorrência e livre mercado”.

Para o Fórum 5G, a maior concentração pode causar a extinção de pequenos provedores de internet no Brasil em um momento em que o país se prepara para fazer o leilão 5G, previsto para outubro. Para eles, as frequências atuais de 2G, 3G e 4G da Oi serão divididas entre Vivo, Claro e TIM,impossibilitando companhias menores de prestarem serviços.

“Sem acesso às redes já instaladas, os pequenos prestadores precisarão investir na instalação de uma imensa rede de tecnologia 5G em múltiplas regiões”, explicaram.

A expectativa do mercado é que a compra da Oi Móvel seja aprovada com diversas condicionantes pelo Cade. Segundo fontes, a ideia é que Vivo, Claro e TIM dividam as cerca de 37 milhões de linhas móveis da Oi por DDD de forma que as três empresas mantenham fatias semelhantes às que já ostentam hoje Brasil afora.

Procurado, o Cade disse que “não comenta processos em análise”. A Anatel, disse que o processo encontra-se em fase de instrução, “o que compreende a apuração dos reflexos da operação e sua adequação à legislação aplicável”.

Perguntada sobre as práticas comerciais, a agência disse ressaltar a representantes de Claro, Vivo e TIM que o cuidado com os clientes atuais da Oi “deve ser uma das prioridades” quando se fala da alienação dos ativos da operadora. E acrescenta que é preciso que as ações de comunicação respeitem a liberdade do consumidor da Oi durante toda a operação.

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