DIAS DE HOJE, por Adriano Dias – 12/12

Um Brasil que ainda não encontra abrigo

A cada 10 de dezembro, o dia dos direitos humanos é marcado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos feito pela ONU logo após o mundo tomar conhecimento das atrocidades da segunda guerra mundial, principalmente o extermínio em massa do o povo judeu, cigano, entre outros. Além de determinados segmentos sociais, de homossexuais, até pessoas com deficiência.
A sociedade contemporânea avança em alguns aspectos, mas se atrasa quando o assunto se refere aos direitos humanos. Ainda existem muitas barreiras a serem derrubadas. Polarizada por frases prontas por interesses individuais, de ambos os lados, o cabo de guerra poucas vezes tem levado a resultados efetivos. Principalmente aqueles mais vulneráveis a violações, de todas as formas, mas que muitas vezes repetem os bordões como “bandido bom é bandido morto” (plagio da frase “índio bom é índio morto”, que fundamentou o genocídio de milhões de índios norte-americanos durante o século XIX). Mesmo tento seus bairros invadidos pelos “cavalos corredores” do Estado.
Em todos estes anos, o movimento social teve seus avanços e retrocessos. Obviamente que muitas situações ainda precisam ser mudadas, pois muita gente ainda se comporta como se estivesse vivendo na idade das trevas.
Recentemente me perguntaram qual seriamos seguimentos sociais mais suscetíveis a violência. A pergunta foi para trabalho acadêmico e, quando comecei a falar, a diminuir o funil, lembrando situações que ajudamos, ou tivemos somente algum posicionamento de orientação, a resposta assustou a garotada estudante: Os travestis adolescentes.
As trans sofrem violência dentro e fora de suas casas. Das críticas e repreensão das famílias aos xingamentos nas ruas; do olhar reprovador no ônibus, até má vontade no atendimento em serviços de estabelecimentos comerciais. Objeto de bullying nas escolas e excluídos do mercado de trabalho. Sem falar da violência física e o abuso sexual que parece ser legitimado pela orientação sexual. Agora imagine todos estes atos contra uma adolescente LGBT de 15 anos que mora nas periferias como a Baixada Fluminense? Sim, a ComCausa já acompanhou casos como este, e não foi só um.
Ao contrário da homossexualidade feminina, objeto de fetiches machistas, ainda mais quando se trata de adolescentes. As menores trans não têm qualquer acolhida e são vítimas de todos os tipos de violências físicas, psicológicas, começando dentro dos seus lares. Sabemos que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não se coloca contra as crianças e adolescentes homossexuais, se referindo apenas que essa pessoa tem direito a saúde, educação, segurança, dentre outras questões básicas. Mas na prática muitos conselheiros tutelares, por exemplo, não se preocupam em como lidar com essas diferenças. Também devemos falar do abuso psicológico e do assédio moral de que são vítimas os adolescentes gays. Por isso, em mais de um momento esbarramos com a falta de capacitação dos Conselhos Tutelares em tratar de crianças e adolescentes LGBTs. Pior, encontramos o preconceito por orientação sexual e até religioso do trato do conselheiro tutelar em questões de violação contra jovens trans.
A realidade vivida pelos adolescentes homossexuais brasileiros é uma ferida aberta a olho nu. São pequenos brasileiros que ainda não conseguem um lugar, muito menos um abrigo na sociedade que se diz “civilizada”. O ideal é que a orientação sexual de uma pessoa fosse tratada apenas como uma “banalidade” como se a outra tivesse nascido com os cabelos claros ou escuros.
Pensando nesse amontoado de problemas que cada vez mais se acumulam em torno dessa, e de outras questões, que todos os seguimentos enfrentam no dia-a-dia, chegamos à conclusão de que os movimentos sociais precisam interagir com outros que também se sentem excluídos dentro da sociedade global. As violações são muitas, contra LBGTS, negros, mulheres, sem terra, sem casa, moradores das favelas. Enfim, enquanto estes seguimentos sociais se fecharem como ostras nos guetos, olhando para o seu próprio umbigo, não conseguiremos avançar na busca das conquistas sociais necessárias para que se possa conviver dentro de um Brasil tão diversificado.
A ComCausa nasceu exatamente com essa preocupação de buscar a união dos movimentos para que juntos procuremos saídas para esses e demais problemas enfrentados por nossa sociedade. A fim de que esta tenha finalmente uma cultura de direitos.

– Adriano Dias é fundador da ComCausa

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