DIAS DE HOJE, por Adriano Dias – 30/01

As árvores na beira da Grama

Existia uma floresta que era habitada na sua maioria por pequenas árvores, mas há muito tempo sofriam com a opressão das grandes árvores. Todas as árvores precisavam de água e luz para sobreviver e as grandes árvores eram responsáveis pela divisão destes recursos que eram direito de todas as criaturas. Mas estas se corrompiam por este poder e ficavam para elas as maiores partes da água e da luz.
Entre estas grandes árvores, tinha uma que se considerava a mais poderosa, era a “rainha das grandes árvores”, sua copa se destacava no horizonte acima do topo das outras. Porém, sua essência era tão má, que nos seus galhos superiores já não cresciam mais folhas e se erguiam carecas para o céu.
Orgulhosa, vaidosa, a rainha-árvore era ajudada por um grupo de grandes árvores, também maléficas, que sobreviviam das sobras de água e luz do sol que a rainha deixava escoar por suas folhagens.
Luz e a água eram direito de todas as árvores da floresta, mas a maléfica rainha, junto com as outras grandes árvores barganhava com as pequenas árvores que só eram lembradas nos períodos das mudas, quando as grandes árvores ficavam mais fracas e a mercê das pequenas. Mas estas pareciam desconhecer o seu poder, e se rendiam a pequenos “favores” das grandes árvores.
Um dia milhares de pequenas árvores morreram do que se falava um mal misterioso. Estas árvores ficavam em uma área um pouco mais afastada, na beira da grama que delineava o fim da floresta.
A revolta se deu entre as pequenas árvores, que resolveram cobrar da toda poderosa rainha, uma explicação e uma solução para o que estavam matando as suas irmãs. No alto de toda a sua arrogância, a rainha mandou que suas comparsas enganassem as pequenas árvores, falando que a culpa era delas, de seu jeito de vida, pelas valas que corriam entre elas. Logo outros milhares de pequenas árvores morreram e logo outras florestas começaram a ficar sabendo do ocorrido. Para não ficar falada, depois de muito tempo, a grande rainha-árvore resolveu, mesmo com asco, voltar-se para as pequenas árvores e falou: O que mais vocês querem? Nem é época de muda!
E um grupo mais corajoso das pequenas árvores desafiou a líder das grandes árvores: Porque você só se dirigiu a nós agora, depois de tantas irmãs morrerem?
A grande árvore-rainha tremeu de ódio com a petulância daquelas insignificantes arvorezinhas. E até mais folhas do seu topo caíram, deixando os galhos superiores ainda mais carecas: Quem vocês pensam que são? – Esbravejou a grande rainha – Eu sou o poder aqui, além do mais, existem milhões de vocês e só morreram treze mil… Eu acho pouco.
As pequenas árvores ficaram chocadas com o descaso pela vida que tinha a árvore-rainha, mas não tinham muito que fazer. Encolheram-se nos seus cantos e continuaram morrendo.
Logo a notícia desta situação se espalhou pelas florestas vizinhas, e também para as florestas distantes. Foram levadas pelos pássaros, que apesar de não serem da mesma matéria das árvores, às vezes entendiam o que elas falavam, e contavam para outros pássaros, que conversavam entre si e eram escutados pelas árvores de bosques distantes.
Assim chegou o dia da muda, e as grandes árvores se voltaram para as pequenas no intuito de cooptá-las com pequenas gotas de água e parcos raios de sol. Mas foi diferente, todas as pequenas árvores se uniram e aproveitando aquele momento de fraqueza, pelas raízes começaram a arrancar as grandes árvores. A primeira a cair foi a rainha, arrasando outras vinte grandes árvores que sustentavam suas maldades, a queda foi tanta que arrancou da terra até uma medíocre rocha que a ajudava a equilibrar-se no alto do seu tamanho.
Foram dias de batalha, mas as pequenas árvores ganharam. Levou tempo até que os estragos de anos de exploração das grandes árvores fossem recuperados, mas depois nenhuma pequena árvore precisou mais barganhar pela água e luz que lhes era de direito. Até mesmo a grama que delineava a floresta, cresceu mais bela e igual.
Baseada em uma vivência pessoal quando várias pessoas morreram de uma “doença misteriosa” no bairro da Grama (Nova Iguaçu), em 2001. Inspirada também na música “The Trees”, do Rush.

– Adriano Dias é fundador da ComCausa

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