Viúva de músico morto por militares do Exército perde emprego e sofre para criar o filho

Um ano após o assassinato do músico Evaldo dos Santos Rosa, fuzilado por militares na Zona Norte do Rio, sua viúva Luciana dos Santos Nogueira, de 42 anos, não sabe se vai conseguir pagar as contas no fim do mês. Os cerca de R$ 3 mil mensais que Evaldo ganhava como segurança de uma creche e tocando cavaquinho em eventos fazem falta no orçamento da viúva, que passou a ter gastos com o tratamento psicológico para ela e o filho Davi, de 8. Os problemas financeiros se agravaram há duas semanas, quando a técnica de enfermagem foi demitida de um dos dois empregos que tinha, num hospital.

Luciana, entretanto, tem direito a uma pensão da União: no último dia 4 de fevereiro, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região determinou o pagamento de R$ 2.348,84 mensais à mulher e ao filho. O valor corresponde a dois terços do que Evaldo ganhava quando era vivo. Até hoje, entretanto, a família não recebeu um centavo.

— O Exército nunca me procurou. Não pediram nem desculpa, não quiseram saber como eu estava, como estava meu filho. Nada. Tivemos que entrar na Justiça para conseguir a pensão, que, hoje, seria fundamental para eu e meu filho podermos nos sustentar. Eu me sinto abandonada — conta Luciana.

Para que ela comece a receber a pensão, restam somente entraves burocráticos, já que a decisão é em segunda instância. O processo segue para decidir sobre um pagamento de indenização à Luciana, Davi e aos irmãos de Evaldo.

Após o crime, a técnica de enfermagem e o filho trocaram a casa de dois andares em que moravam com Evaldo em Rocha Miranda por um pequeno apartamento de dois quartos num bairro próximo. A mudança foi provocada pelas lembranças que a casa provocava em Luciana, que morou ali com Evaldo por 20 anos.

Seu filho também teve que mudar de escola: após a morte do pai, ele passou a apresentar comportamento agressivo com os colegas. Duas consultas semanais a uma psicóloga passaram a fazer parte da rotina de Luciana e Davi, que também estavam no carro fuzilado:

— O Davi passou por um trauma muito forte. Perdeu o pai, o melhor amigo. O Duda (como ela chama Evaldo) era muito carinhoso com ele. Outro dia, ele me olhou, fez uma cara de choro e disse: “Tenho vontade de socar a cara de alguém”. É um menino carinhoso, mas às vezes fica agressivo. Por isso, o acompanhamento profissional é importante — diz a técnica em enfermagem.

Em 6 de fevereiro, Davi passou seu primeiro aniversário sem o pai. Fez questão que a festa fosse iguais aquelas organizadas por Evaldo: com música ao vivo e a presença de todos os amigos. A mãe queria só uma festinha na escola, mas acabou cedendo.

— Eu desabei quando ele falou: “Mãe, eu tenho que comemorar porque sou um sobrevivente”. Fiz a festa do jeitinho que ele queria.

No total, os 12 militares fizeram 257 disparos de fuzil e pistola na tarde de 7 de abril de 2019. O carro do músico foi perfurado por 62 tiros. O tenente Ítalo Romualdo, que comandava a tropa, foi responsável pela maior quantidade de disparos, 77. Os militares alegam que não queriam acertar Evaldo, mas que reagiram a um assalto e que viram Luciano armado.

Eles respondem ao processo em liberdade. A sentença deve sair ainda no primeiro semestre.

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