Avaliação do Renault Kwid E-Tech 100% elétrico 2023

Por Arnaldo Bittencourt / Fotos: Marcus Lauria

Tenho para mim que os carros elétricos ainda não se tornaram populares no Brasil em função do preço de aquisição.  As vantagens dos elétricos em relação aos carros à combustão são evidentes: exigem menos manutenção, o custo por quilometro rodado é menor, não emitem gases poluentes. 

CONFIRA O VÍDEO: https://youtu.be/o_WNowGT_K4

Já os carros híbridos, que são aqueles que trazem motores à combustão e elétrico, conseguiram alcançar certa popularidade, prometendo grandes avanços em autonomia e emissão de poluentes. De maneira geral, funcionam assim: o motor elétrico sustenta o carro em baixa velocidade. O motor à combustão entra em ação quando o motorista exige mais desempenho ou quando o sistema do carro entende que é necessário. A grande vantagem dos híbridos é que não exigem paradas em eletropostos, pois quem recarrega a bateria do motor elétrico é o motor à combustão.

É fato que o Kwid E-Tech é o carro 100% elétrico mais barato do Brasil. Mesmo assim, quem está disposto a pagar R$150 mil em um carro pequeno e básico? Pois bem, arrisco três possibilidades: (i) uma empresa que, por alguma questão comercial, necessita ter em sua frota carros elétricos; (ii) alguém empolgado com tecnologia; ou (iii) alguém extremamente preocupado com a emissão de gases poluente na atmosfera.

Fabricado na China, o Renault Kwid E-Tech 100% elétrico mostrou-se durante o teste um ótimo carro para a cidade, equipado com os recursos tecnológicos considerados essenciais na atualidade (tem multimidia com Android Auto e Apple Carplay, por exemplo), atendendo perfeitamente as expectativas de alguém que precisa de um carro pequeno para ir e voltar do trabalho.

É claro que, antes de pegar um carro 100% elétrico, o consumidor precisa pensar onde fará as suas recargas. A bateria de 26,8 kW.h do Kwid, de íons de lítio, pode ser recarregada de três formas: (i) em uma tomada 110V/220V utilizando o carregador portátil que vem com o carro;  (ii) um wallbox de corrente alternada, muito comum em supermercados, estacionamentos, shoppings e alguns postos de combustível; (iii) pontos de carregamento rápido em corrente contínua (mais raros).

Para carregar em casa, é importante ter uma tomada 220V de 20A. Não aconselho utilizar adaptadores de 10A para 20A, pois eles podem superaquecer e derreter. O carregador portátil também é bastante sensível e interrompe a recarga ao detectar qualquer instabilidade na rede.  Carregando em uma tomada 220V, uma bateria em nível baixo deveria estar próxima do 100% após 9h de recarga. Em 110V, o tempo de recarga praticamente dobra!

Considerando que a autonomia do Kwid pode chegar a 298km (segundo a Renault), uma bateria cheia ou praticamente cheia (88-98%) deveria ser capaz de atender uma pessoa durante toda a semana de trabalho sem necessitar de novas recargas. Claro que, para essa afirmação ser verdadeira, o trabalho da pessoa deve ficar a mais ou menos 10-15km de casa, e o carro deve ser usado apenas para ir e voltar do trabalho. O motorista deve rodar no limite de velocidade da via, sem acelerações fortes repentinas.

Durante o teste não consegui que o computador de bordo indicasse essa autonomia de 298km. Com a bateria no 95%, o computador indicava 185km de autonomia.  Além de carregar em casa, também carreguei o Kwid em um wallbox de shopping.  Essa foi, inclusive, minha primeira experiência recarregando um carro elétrico.  Em 1h30 minutos de recarga, levei a bateria dos 50% aos 97%. A recarga não foi cobrada. Fiquei maravilhado!

Ao terminar a recarga, tive dificuldade para soltar o cabo da tomada do Kwid. Por uma questão de segurança, o cabo fica travado na tomada assim que a recarga começa. Na hora de encerrar a recarga, tentei tirar o cabo e nada… Ele ficou travado, e mesmo colocando um pouco mais de força na puxada o bicho não dava sinais de que iria soltar. Após alguns minutos tentando achar um botão para soltar o cabo, acabei descobrindo que para soltar o cabo é necessário apertar o botão de destravamento das portas, que fica na chave do carro.

Imagino que esta informação está no manual do carro (em destaque, espero!)… Infelizmente alguns carros de imprensa são disponibilizados aos jornalistas sem o manual do usuário, então tive que descobrir como soltar o cabo na “marra” mesmo. Como as pessoas costumam não ler manual, seria interessante a Renault colocar um adesivo próximo à tomada de recarga do Kwid ensinando como fazer para soltar o cabo após uma recarga. O adesivo poderia trazer uma mensagem assim: “Press “símbolo do cadeado aberto” to release”. Pronto, já é suficiente!

Saliento que não encontrei pontos de recarga rápidos nos locais por onde circulei com o Kwid (aqueles em corrente contínua, capazes de praticamente encher uma bateria “vazia” em 30-40 minutos. Encontrar pontos de recarga (eletropostos) em uma cidade grande não é difícil. Hoje em dia existem muitos lugares com eletropostos. O problema é que muita gente não respeita o local de recarga e estaciona o carro na vaga reservada ao elétrico que necessita usar o carregador. Imagina você chegar com pouca carga e não conseguir carregar porque alguém estacionou seu veículo FLEX na vaga da recarga…

Em parceria com uma empresa brasileira, a Renault lançou um aplicativo para Android e iOS que permite aos donos dos eletropostos cadastrarem os seus pontos de recarga. O app se chama “Mobilize Charge Pass” Usei esse aplicativo, que é bastante intuitivo. Similar ao WAZE ou Google Maps, nesse app vc consegue visualizar os eletropostos mais próximos. Clicando nos ícones representativos dos eletropostos, é possível visualizar se ele está livre ou não. Também é possível agendar o seu horário de recarga. Consta também se o ponto é gratuito ou pago. Se for pago, é necessário cadastrar um cartão de crédito para poder pagar ao final do processo pela energia utilizada. 

Pesando 977kg, o motor elétrico do Kwid entrega uma potência máxima de 65cv. O torque máximo é de 11,5kgfm, estando disponível a todo momento, como em qualquer carro elétrico. Vale destacar que não há um câmbio como nos carros à combustão… Existe uma transmissão que conecta o motor diretamente às rodas, sem marchas. Para dar ré, a polaridade é invertida e o motor gira no sentido contrário… Coisas de carro elétrico!

Esse conjunto é capaz de acelerar o Kwid de 0 a 50km/h (velocidade muito comum nas cidades) em apenas 4,1 segundos. O 0-100km/h fica na casa dos 13-14 segundos. Interessante notar que a velocidade máxima do carro é de 130km/h. Ele não demora tanto a chegar nessa velocidade, entretanto andando acima dos 90km/h a autonomia cai consideravelmente.

Com o modo ECO ativado, a potência máxima cai para 45cv e a redução na performance é bastante perceptível. Em compensação, o gasto de energia é menor e o sistema de regeneração de energia do carro fica mais atuante, contribuindo definitivamente para o aumento da autonomia.  Cogitei fazer uma viagem da capital do Rio de Janeiro para a cidade de Miguel Pereira, que fica a mais ou menos 100km da capital. Desisti da empreitada porque: (i) iria rodar de carro cheio, penalizando a autonomia; (ii) rodando na estrada, em velocidades mais elevadas, a autonomia seria bem menor; (iii) pelo aplicativo não vi nenhum eletroposto em Miguel Pereira. Não é carro “amigo” da estrada, definitivamente.

Outro ponto que faz o Kwid não ser um bom carro na estrada: a suspensão. Em baixa velocidade o acerto funciona muito bem… Você não sente buracos, lombadas, nada. É como se o asfalto fosse mais liso do que realmente é.  A suspensão do Kwid é bastante elevada. Dificilmente o Kwid raspa em algum obstáculo. Ou seja, o dono do Kwid jamais se verá na mesma situação do dono daquele Fiat elétrico que aparece em um vídeo que anda circulando nas redes sociais. Nesse vídeo, o FIAT está em um elevador de oficina e quem está gravando aponta para a bateria do carro, localizada na parte inferior (rente ao solo), destacando que ela foi danificada após o modelo raspar em um obstáculo, gerando um prejuízo elevado para o proprietário.

Em compensação, em velocidades mais elevadas o acerto da suspensão do Kwid prejudica o comportamento do modelo nas curvas. Em situações de estresse (além do uso normal), as rodas dianteiras chegam a destracionar, dando trabalho para o controle de estabilidade.  Os pneus são 175/70R14 e privilegiam a autonomia. Essa é outra característica do Kwid que faz com que ele não seja bom de guiar em velocidades mais elevadas. Em relação às rodas, vale destacar que o Kwid elétrico apresenta 4 parafusos de fixação das rodas, contra 3 do modelo à combustão. Faço questão de levantar o ponto, considerando que a versão à combustão é criticada pelos “experts da internet” pelo fato de ter apenas 3 parafusos fixando as rodas.  

O Kwid é capaz de carregar até 4 adultos…  Não há cinto de segurança para 5 passageiros. O espaço interno é pequeno, mas com carro cheio ninguém ficou desconfortável. As pessoas ficaram muito próximas umas dAs outras, mas sem apertos. Havia espaço para pernas e cabeças no banco traseiro. O porta-malas desse compacto urbano é diminuto: são 290 litros para acomodar as bagagens.

No quesito segurança, o Kwid não faz feio… São 6 airbags, ABS e controle de estabilidade. Há também assistente de saída em rampa, além de um item que só faz sentido em carro elétrico: o AVAS, ou “Audible Vehicle Alert Sound”, que nada mais é que um ruído para alertar os pedestres sobre a movimentação do veículo elétrico. Confesso que não ouvi esse tal ruído em momento algum.

O ar-condicionado é bem forte, gela o carro rapidinho. Entretanto os controles são mecânicos e não há função AUTO ou controle de temperatura independente para 2 ou mais zonas do carro. O acabamento interno é bem simples, muito plástico duro, luxo zero. Quem dá importância a isso não vai gostar do interior desse modelo. O fato de ser elétrico não melhora em nada o nível do acabamento interno.

Os bancos são finos mas seguram bem o corpo. O revistimento é bonito, misturando couro sintético com tecido. As regulagens são todas manuais, não há ajuste elétrico. Os vidros elétricos não têm função “onetouch” e quem senta na frente não consegue comandar os vidros traseiros!

A multimidia, com tela de 7”, é bem simples… A única porta USB do carro fica nele, inclusive. O som sai pelo painel do carro, com qualidade sonora baixa. O botão do volume fica na própria multimidia, não há controle de volume no volante. O sistema, entretanto, é compatível com Android Auto e Apple Carplay (via cabo). O modelo tem uma câmera de ré muito boa, a imagem é bem nítida. As retas da tela não acompanham a trajetória do carro, entretanto. o carro também conta com sensor de estacionamento traseiro.

A direção do Kwid é elétrica, muito leve, confortável de usar. Em velocidades mais elevadas, ela endurece e passa a sensação correta. No belo volante de quatro raios encontra-se apenas o controlador do limitador de velocidade (que é acionado na parte inferior do console central). Não há piloto automático, infelizmente. O limitador, entretanto, se faz presente sob o argumento de que pode ajudar a aumentar a autonomia do carro, ao impedir que o motorista rode em velocidades mais elevadas. Na minha opinião, limitadores de velocidade são sistemas irritantes.  Consigo controlar a velocidade numa boa, sem a necessidade deles.

O painel de instrumentos do Kwid é bonito e funcional. Todo colorido, em LED, conta um econometro capaz de indicar para o motorista a forma de condução do carro. Assim, no modo CHARGE, que representa um uso similar a um freio-motor, a bateria está sendo recarregada (3 níveis de recarga demarcados por leds em cor azul). No modo NEUTRAL, o motor não está consumindo bateria (led indicador branco). Já no modo ECO, que é considerado o modo de condução normal (não confundir com a função ECO, que sacrifica a potência do motor, dentre outros ajustes, privilegiando a autonomia), o consumo de bateria está dentro da normalidade. Há vários níveis no modo de condução ECO (luzes verdes). Finalmente temos o modo de condução POWER, com dois níveis de indicação (luzes vermelhas). Nesse modo, a autonomia é reduzida drasticamente, devendo ser usado de forma eventual.

O fato é que carro elétrico exige uma tocada macia, sem rompantes… Dirigindo calmamente, de forma previsível e segura, o motorista consegue alcançar uma ótima autonomia com um carro elétrico.  Esse efeito também se verifica no consumo dos carros à combustão, obviamente. Dirigir “aos trancos e barrancos” não faz bem para o bolso, seja no carro elétrico ou no carro à combustão!

No painel de instrumentos também é possível visualizar o computador de bordo do Kwid, que traz as informações sobre a autonomia e outras informações sobre o consumo do modelo. Também há um indicador de marcha (D, N ou R) e o nível da bateria, dentre outras luzes-espia (acionamento do freio de mão, pressão dos pneus…)

Interessante notar que as informações aparecem em português no painel, mas ao iniciar uma recarga o painel traz informações em inglês. O sistema de iluminação do Kwid é em led na traseira… Na dianteira apenas o DRL (luzes de rodagem diurnas) é em LED. Os faróis usam lâmpadas convencionais, assim como os faróis de neblina (que inclusive não são úteis em um modelo urbano). Um elétrico deveria ter todo o sistema  de iluminação em LED, não é mesmo?  Os freios são a disco ventilado na dianteira e tambor na traseira. Eita, tambor na traseira??? Hora do “fight”!!!! Bom, quem me conhece sabe o que eu penso sobre isso. Prometo não abordar essa polêmica aqui.

Como o Kwid é elétrico, os freios acabam sendo pouco utilizados, pois o sistema de regeneração de energia do carro gera um efeito similar a um “freio-motor”, capaz de reduzir bastante a velocidade, como se o freio estivesse sendo utilizado. Percebi que as vezes o sistema do Kwid desabilita o “freio-motor” e libera o carro sem dar aviso, dando pequenos sustos no motorista, pois a força que vinha reduzindo a velocidade do carro desaparece, obrigando o motorista a pisar mais forte no freio. Mas é só um detalhe, uma questão de hábito, me acostumei rápido ao esquema.

Uma característica que chamou a minha atenção: o modelo tem freio de mão convencional, sem acionamento eletromecânico (por botão). Estranho, né? Um elétrico com alavanca de freio de mão manual… Funciona muito bem, claro, mas a gente não espera ver isso em um modelo 100% elétrico, envolvido em uma atmosfera futurista. Outra coisa que é inesperada: a chave é normal, tipo canivete (pelo menos isso!), nada de chave por aproximação. Assim, para entrar no carro, você usa a chave ou aperta o botão do “cadeado” que também fica na chave.

Quer ligar o carro? Tranquilo… Basta inserir a chave na ignição, girar e esperar acender um “OK” verde no painel de instrumentos. Mas atenção, o “OK” só acende se você virar a chave com o pé no freio. O freio de mão também precisa estar acionado. Estando tudo certo, verifique se o “OK” verde está aceso no painel. Caso positivo, perfeito… O Kwid está pronto para andar. Basta girar o botão seletor de marcha para o D e acelerar. Não se esqueça de soltar a freio de mão antes!

 Os preços dos carros estão na estratosfera e o Kwid é o elétrico mais barato do país. Certo, é um carro básico, com acabamento simples, mas pelo menos tem ar-condicionado, multimidia e 6 airbags… Para muita gente que está buscando um carro compacto urbano isso é suficiente.

Os principais concorrentes são o Caoa Chery iCar (R$150 mil) e o JAC E-JS1 (R$160 mil). São produtos parecidos, sendo que o Caoa apresenta ligeira vantagem em relação aos equipamentos de série. É um carro muito pequeno, com o porta-malas comportando apenas 100 litros. O JAC é fruto de uma parceria entre a JAC e a Volkswagen, então apresenta um ótimo acerto de suspensão. Em termos de autonomia, os três modelos (Kwid, iCar e JAC) são parecidos, sendo que o JAC é o único com bateria de fostato de ferro-lítio (mais estável, menos propensa a incêndio em caso de acidente, dentre outras vantagens).

Uma grande vantagem do Kwid em relação à concorrência é que as peças de lataria e acabamento são compatíveis com as peças do Kwid à combustão, muito popular nas ruas brasileiras. Assim, em caso de acidente, é mais fácil conseguir encontrar a peça de reposição. Em suma, quem estiver em busca de um carro 100% elétrico para uso urbano deve dar uma olhada no Kwid.

*FICHA TÉCNICA:

Mecânica

Motorização N/D

Combustível             Híbrido / Elétrico

Potência (cv)            65

Torque (kgf.m)         10

Câmbio          automática de 1 marchas

Tração           dianteira

Direção          elétrica

Suspensão dianteira          Suspensão tipo McPherson, roda tipo independente e molas helicoidal.

Suspensão traseira            Suspensão tipo eixo de torção, roda tipo semi-independente e molas helicoidal.

Dimensões

Altura (mm)   1.479

Largura (mm)           1.579

Comprimento (mm)             3.680

Peso (Kg)      977

Tanque (L)    N/D

Entre-eixos (mm)     2.423

Porta-Malas (L)        290

Ocupantes    4

*Dados do fabricante

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