*Davi de Castro
O Brasil desperdiça mais de 15 bilhões de reais em mais de 5 mil obras espalhadas em municípios de Norte a Sul do país. Isso porque o governo que assume o cargo, geralmente abandona totalmente a obra ou o ato iniciado pelo governante anterior. Esse levantamento é fruto de pesquisa feita pelo Ministério de Cidades, em parceria com os Tribunais de Contas dos Estados (TCEs). E a montanha de dinheiro jogada fora é oriunda dos impostos de várias naturezas pagos pelo povo, como IPTU, ISS, ITBI, ICMS, Taxa de Iluminação dentre outros.
E esse mesmo país que joga o dinheiro do povo pelo ralo, de acordo com a Fundação João Pinheiro, em parceria com o mesmo Ministério, detectou que o Brasil precisa construir 8 milhões de moradias na área urbana para realizar o sonho de milhares de famílias de baixa renda – aquelas que vivem na miséria ou ganham até três salários mínimos. Em um país que sofre o abandono de questões sociais importantes, como o da moradia, esse ato poderia ser definido como “delinquência politica” e punição severa.
O estado de São Paulo, por exemplo, com 45 milhões de habitantes, concentra o maior déficit habitacional, em torno de 1,2 milhão de moradias. O Rio de Janeiro, com 16 milhões de habitantes, precisa construir 516 mil moradias populares. Proporcionalmente, a situação do Rio é mais agravante. Na Baixada, a carência habitacional é de 87 mil unidades.
Em Nova Iguaçu, cujo déficit chega a 30 mil casas populares, a administração do novo prefeito Rogério Lisboa, engorda a estatística da obra ou ato abandonado. Seu governo desprezou um cadastro de 40 mil pessoas inscritas para a casa própria, através do programa Minha Casa, Minha Vida – o maior programa de moradia deste pais criado em 2009 para construir 2 milhões de casas para famílias de baixa renda. E fez o mesmo com outras 10 mil famílias que já estavam na fila para receber as chaves do imóvel pela Caixa Econômica Federal. Isso, apenas com um ato: o de desconsiderar o que estava pronto pelo governo anterior. A equipe de transição do setor recebeu a senha (1q2w3e4r) de acesso ao cadastro (um defensor público esteve presente à transição). Mas o governo justificou que não havia cadastro algum e anunciou nova inscrição. A sensibilidade humana não poderia faltar nos atos de um homem público. Mas a ordem foi começar tudo de novo.
Ganhando a vida atualmente como professora de jazz e dança afro, para sustentar a filha e a mãe, Virgínia Lemos de Moraes, 53 anos, a Gina, portadora de disfemia (gagueira), começou trabalhar aos 12, como explicadora de alunos do primário à 6ª série, sonhando em ter um dia a sua própria moradia. Ela relata a sensação de receber as chaves. “Vivi com muita dificuldade. Comia feijão com arroz. Quando tinha ovo, era festa. Receber as chaves da casa, depois de quatro anos de vai e vem, juntando documentos, foi a realização do meu maior sonho. Eu chorei. E vi muitos idosos chorando também”, resumiu.
As lágrimas de milhares de famílias, ao contrario das de Gina e de outros idosos, foram de tristeza por terem seus sonhos abandonados por um ato de governo. Não se levou em consideração os três ou quatro anos de andanças até o ato da inscrição para o Minha Casa Minha Vida. Nova Iguaçu também desperdiça tempo e dinheiro. O custo desse retrocesso, quem paga é o povo.
*Davi de Castro é jornalista.