Defesa do Consumidor – 10/06

Alta da inflação encolhe produtos, não o preço

Reduzir embalagem é legal, se informado no rótulo, mas especialistas alertam para risco de cliente ser enganado
A alta da inflação, que acumulou 4,56% no ano até abril, superando o centro da meta perseguida pelo governo para o ano inteiro, de 4,5%, traz uma nova onda de redução de embalagens, já percebida por consumidores, que acabam levando para casa menos produto pelo mesmo preço. Na prática, a medida funciona como uma espécie de reajuste disfarçado, para não ser percebido pelo comprador. A indústria fala em readequação de tamanhos e não dá detalhes sobre os motivos das mudanças. Mas, para economistas, trata-se de uma estratégia do setor para compensar o aumento de custos sem reajustar preços, e sem correr o risco de perder mercado.
Segundo o economista Gilberto Braga, em entrevista para o O Globo, o método de encolher o tamanho é antigo, da época da hiperinflação. “A quantidade do produto diminui, mas o preço continua o mesmo de quando era vendido em quantidade maior. Procura-se passar uma mensagem de que o produto não aumentou de preço e continua acessível aos bolsos e, muitas vezes o consumidor acaba enganado”, explicou.
Se o rótulo da embalagem comunicar a mudança por três meses a partir da alteração, como determina a Portaria 81 do Ministério da Justiça, em vigor desde 2002, não há ilegalidade nessa redução. Foi o que fez recentemente a Pandurata Alimentos, detentora da marca Bauducco, que reduziu o produto wafer de 165g para 140g, informação agora presente no rótulo do biscoito. Outra mudança sentida pelos consumidores foi no requeijão Itambé. Desde agosto do ano passado, a apresentação foi reduzida de 250g para 220g.
Mas, mesmo que a informação seja dada, ainda há problema quando o varejo mantém o preço para um produto que encolheu, avalia Ione Amorim, economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). “Essa prática pode caracterizar aumento injustificável de preço, o que é proibido pelo Código de Defesa do Consumidor. E as pessoas devem procurar o Procon e denunciar”, disse Ione.

Supermercados confirmam estratégia

O lançamento de versões menores de alguns produtos também requer atenção. É o caso do sabão em pó Ace Naturals, que ganhou um pacote de 750g, além do tradicional, de 1kg; e do kit promocional de xampu e condicionador Dove, que além da versão com ambas as embalagens de 400 mls, agora tem uma versão com o xampu de 400mls e o condicionador de 200mls, embalados num invólucro de papel, igual ao do produto maior. Se o consumidor, acostumado ao kit antigo, não prestar atenção no volume dos produtos informado no rodapé da caixa, pode levar para casa menos condicionador do que pensa. Já o preço é praticamente o mesmo cobrado na versão maior.
Além da denúncia, Ione recomenda que se busque alternativas, como a troca por outra marca que tenha o mesmo produto em tamanho maior e, quem sabe, seja até mais em conta.

— O consumidor tem que aprender a se posicionar, a boicotar. A partir do momento que ele faz a substituição, ajuda a conter essa onda.

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O presidente-executivo da Associação dos Supermercados do Estado do Rio (Asserj), Aylton Fornari, explica que a precificação, nesse caso, não depende do varejo, pois a indústria entrega aos comerciantes um produto menor, ao mesmo preço.
Desde a implantação da portaria em 2002, o Ministério da Justiça já aplicou 85 multas em empresas por alteração do volume do produto sem comunicação adequada ao consumidor. Juntas somam R$ 31 milhões. As duas mais recentes foram aplicadas em abril do ano passado, quando as fabricantes da água mineral Minalba e do xampu Colorama Ultra Camomila foram penalizadas em R$ 419.201,20 e R$ 543.659,25, respectivamente. A Minalba reduziu as embalagens da Água Mineral com Gás de 600ml para 510ml. A Procosa Produtos de Beleza, fabricante do xampu Colorama, reduziu a embalagem de 500ml para 350ml, sem a devida informação ao consumidor. As duas fabricantes recorreram das decisões do órgão e aguardam julgamento dos recursos. Elas garantem ter informado sobre as mudanças, como determina a portaria.

Empresas negam relação com preço

A Pandurata Alimentos informou que a mudança no wafer Bauducco ocorreu no Sudeste do país, ano passado, “devido ao movimento de harmonização adotado pela marca”. A região Sul já possuía o produto na versão 140g. A Itambé disse que a linha de requeijão passou por uma adequação na embalagem de 250g para 220g em agosto de 2014, “para enquadrar o produto no padrão de gramatura usual para a categoria (de alimentos)”. A empresa informou, ainda, ter comunicado os consumidores sobre a alteração nos rótulos, conforme determina a portaria, e nas gôndolas.
A P&G, fabricante do sabão em pó Ace Naturals, garantiu que a marca não substituiu a embalagem de 1kg, mas sim incrementou o portfólio lançando a versão com 750g. Acrescenta, ainda, que “embora não tenha controle sobre os preço no mercado, a embalagem menor dificilmente é vendida pelo varejista com preço semelhante à de 1kg”.
A marca Dove disse que os dois kits promocionais têm preços distintos. O maior no valor médio de R$17,90, e o com condicionador 200ml R$ 13,90 em média.

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