Vista a perder de vista

*Almir Pazzianotto Pinto

“a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (Constituição da República, art. 5º, LXXVIII).

Nos últimos dias os leigos em matéria processual devem sentir-se confusos diante de controvertidas notícias sobre o julgamento da chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Comenta-se que, dependendo dos rumos que vierem a ser tomados durante a sessão, será inevitável que algum ministro peça vista do processo para devolvê-lo em 2019, após as eleições presidenciais.
Não duas as modalidades de pedido de vista: há vista em mesa, quando o julgador acredita que rápida consulta do processo, no decorrer da sessão, permitir-lhe-á proferir voto, e vista regimental, quando são interrompidos os trabalhos para que o magistrado tenha tempo suficiente, no gabinete ou em casa, de se esclarecer e sentir-se capacitado a votar.
Os regimentos internos dos tribunais disciplinam o pedido de vista. No caso da vista regimental, o processo deverá ser devolvido dentro de breves dias, para que não se protele o julgamento por tempo interminado. O Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho, que integrei e presidi, determina, tratando-se de vista regimental, que o julgamento seja adiado “para a primeira sessão subsequente ao término do prazo de dez dias, prorrogável por igual período, mediante pedido devidamente justificado, podendo os demais Ministros adiantar seus votos.”
A rigidez da legislação interna não impede, todavia, que alguns senhores Ministros – não todos – retardem a devolução dos autos por tempo indeterminado. É o que hoje ocorre no Processo nº 96500-81.200.5.15.0128, cujo pedido de vista regimental foi formulado em 29/4/2015, isto é, há quase dois longos anos, provocando a paralisação do julgamento. Petições dirigidas ao próprio Ministro, ao Presidente do Tribunal e ao Conselho Nacional de Justiça resultaram infrutíferas. Nada abala o sono em que mergulhou o processo.
No Supremo Tribunal Federal (STF), guardião da Lei Superior, em 19/6/1997 deu entrada Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 1625, com o objetivo obter a decretação da inconstitucionalidade do Decreto 2.100/1996. A causa foi distribuída ao falecido Ministro Maurício Corrêa e, desde então, ou seja, há quase 20 anos, tramita com a lentidão das preguiças em virtude de intermináveis vistas regimentais. Houve caso em que o Ministro pediu vista regimental, tempos depois se aposentou sem proferir voto, sendo o processo entregue como estava ao sucessor.
O Ministro Gilmar Mendes, integrante do STF e presidente do TSE, declarou, a propósito do assunto, que “Não há pedido de vista a perder de vista”. Os fatos, entretanto, mostram o contrário. O que não há é disciplina judicial, capaz de fazer com que processos com pedidos de vista regimental sejam devolvidos dentro do prazo determinado.
O Regimento Interno do TSE (Resolução nº 4.510/1952), salvo engano não contempla a possibilidade de Ministro fazer uso desse expediente. A ausência é justificável, pois a celeridade inerente ao processo eleitoral não se coaduna com interrupção de julgamento. Pedir vista, levar o feito para a casa e não devolvê-lo, significa retardar decisão urgente, como no processo de impugnação da chapa Dilma-Temer. A sentença poderá ser tomada em qualquer direção, desde que fundamentada. Intolerável é que o Tribunal não julgue e agrave o clima de insegurança política, refletido na paralisação geral da economia.

*Almir Pazzianotto Pinto foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

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