Como acabar como uma CPI?

*Anthony Garotinho

Tenho vivo em minha mente o dia em que apresentei, à CPI do Cachoeira, denúncias envolvendo o então governador Sérgio Cabral e Fernando Cavendish, ex-dono da empresa Delta. Na ocasião, levantei uma série de perguntas sobre essa promíscua relação. Meu intuito era que elas fossem entregues aos membros da comissão que investigava as ligações do bicheiro Carlinhos Cachoeira com o empreiteiro, amigo de Cabral.
Uma vez que meu partido indicou outro deputado como membro da comissão, apesar da minha insistência em ser eu o indicado, resolvi explodir, ao meu modo, o esquema montado para abafar o envolvimento nas irregularidades de Claudio Abreu, o então diretor da Delta na região Centro-Oeste.
Passei uma nota para a imprensa revelando a viagem de Cavendish ao exterior com os membros da CPI. Eles jantaram, como sempre, em Paris. Em represália, começaram a me detonar, dizendo que eu queria transformar uma situação política local (minhas divergências políticas com Cabral) numa investigação nacional.
Era justamente o contrário. Escolhi o diretor do Centro-Oeste porque não afetaria Cabral diretamente e, sim, os governadores Marconi Perillo, de Goiás, e Agnelo Queiroz, que, à época, estava à frente do Distrito Federal.
Não teve jeito.
Fui chamado para uma conversa com os membros da CPI. E eles foram claros. Disseram que não dava para explodir todo mundo; se a CPI continuasse, iria atingir governos federal, estaduais e municipais. Foi, então, que eu respondi: “bem, essa é uma decisão de vocês; se não falo aqui, denunciarei na tribuna e no meu blog”.
Naquela tarde, fiz um discurso duríssimo na tribuna da Câmara, fato que deixou o ex-deputado Eduardo Cunha, quase um advogado da Delta, preocupadíssimo. Veio, então, o famoso SMS que desmoralizaria de vez a CPI. O ex-petista Vacarezza diria a Cabral: “Não se preocupe; você é nosso, e nós somos teu”.
O próximo passo foi a estratégia de sempre. Envolveram todo mundo, que é o melhor modo de um proteger o outro. Quando chegaram à CPI as quebras dos sigilos telefônicos de Cavendish com o mundo político, um deputado me disse: “Agora, a Inês é morta”. Repliquei: “Coitada da Inês, já morreu e nem sabia. Só que a CPI morreu primeiro”.
O Brasil é sempre assim: quando a investigação é disparada contra muitos alvos, acaba não atingindo nenhum. Aliás, Cavendish é um mistério: apesar de tudo que se sabe sobre ele, tudo que fez, as pessoas que corrompeu, está em prisão domiciliar, mesmo sem ter feito delação premiada.
Afinal, o que será que Cavendish sabe e não querem que ele diga?

*Anthony Garotinho é ex-prefeito de Campos, ex-deputado federal e ex-governador do Rio de Janeiro.

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