Montillo se despede do futebol e agradece ao Botafogo

“Agradeço a compreensão da diretoria, comissão técnica, jogadores. Foi uma passagem rápida, mas muito feliz”, disse o argentino
Satiro Sodré / SS Press

Chegou ao fim a carreira de Walter Montillo. Após rescindir seu contrato de maneira amigável com o Botafogo, o meia, de 33 anos, concendeu entrevista coletiva, ontem, no Estádio Nilton Santos, e anunciou que não vai mais jogar futebol. Sofrendo constantes lesões, o jogador contou que seus problemas físicos foram determinantes para tomar a difícil decisão. Comovido, agradeceu a confiança depositada por todos no clube, aos torcedores alvinegros pelo carinho e compreensão e se desculpou por não ter conseguido corresponder dentro de campo à expectativa criada. “Agradeço a compreensão da diretoria, comissão técnica, jogadores. Foi uma passagem rápida, mas muito feliz. Dentro e fora do campo. Todos me ajudaram nas coisas que aconteceram comigo. Me machuquei cinco vezes seguidas, nunca tinha acontecido. A fisioterapia fez um trabalho excelente comigo. O Jair, a preparação física…todos muito profissionais. Infelizmente meu corpo me disse que não posso mais ficar 100%. Fiz tudo para voltar e ajudar. Não consegui. A genética e o físico não deixaram eu fazer o que eu mais gosto. Sempre falei para a minha esposa, vou jogar até onde eu conseguir dar meu máximo. Esse momento foi agora. Foram 15 anos muito bons, para tentar continuar em algo que eu sei que não vai dar certo. Então prefiro ficar com as coisas boas que conquistei no futebol. Acho que para o clube e primeiramente para mim a decisão era parar. Não vou ficar aqui cobrando salário sabendo que não vou conseguir jogar. É o momento de parar e deixar os meninos que estão chegando. Vou levar as coisas boas, amigos, companheiros, funcionários. Nessa hora vou ser um pouco egoísta, pensar em mim. Não consigo fazer o que eu fazia até ano passado. Agradeço a todos. Continuar com outras coisas, outros projetos que eu tenho. À torcida do Botafogo e aos torcedores que passaram na minha vida, saibam que sempre dei meu máximo. Isso aqui vai ser dolorido uma ou duas semanas, mas a vida continua. Desculpa se fiz algo errado para alguém. Obrigado a todos. Obrigado, mais uma vez ao Botafogo, mesmo não conseguindo jogar meu futebol, não foi sacanagem, não foi falta de vontade. Foi importante ter jogado aqui. Obrigado”, disse.

 

Confira os demais pontos da entrevista coletiva

Acho que essa última lesão foi a gota d’água. Fiquei dois meses treinando muito, esperando o momento certo para voltar a jogar. E com três minutos senti a lesão. A minha vida toda nunca fiquei em uma maca esperando as coisas acontecerem. Sempre fiquei jogando bola. Estou há seis meses com cinco lesões. Não é meu perfil. Tenho que estar dentro de campo. Isso me fez pensar e falar chega. Mais do que fiz não posso fazer. É ruim para mim, para minha família, para meus companheiros. A idade chega. Se não sou feliz fazendo o que mais gosto, chega. O Botafogo acreditou muito em mim, eu acreditei muito em mim, não é desculpa, mas agora já era. Sempre fui muito feliz a minha vida toda e nesse momento estava sofrendo muito. O Botafogo não merece isso. O time tem um ano muito bom, então eu ficar não podendo jogar…é o momento de outro jogador, vou torcer. Tomei uma decisão que julgo correta.
>> Botafogo no coração – Criei uma expectativa grande aqui no Botafogo, mas não atingi por conta de lesões, do meu físico. Então não quero criar expectativa para o torcedor de algo que não vai chegar. A alegria do botafoguense é ver o time jogar bem, o Montillo jogar bem. Tentei ajudar no vestiário, no treino, no início da Libertadores, contra o Colo Colo, mas depois não consegui. Agradecer ao torcedor por mesmo sem eu render me respeitar. Isso não se compra. Eu levo muitas coisas daqui, esse carinho eu não vendi pra ninguém. Foi tudo no dia a dia. Por mostrar como eu sou, igual a todo mundo. Sair pela porta da frente, é o que me deixa feliz. Tenho certeza que no sábado, quando vier me despedir de todos, vou chorar de novo.

 

Peso da família e o que fazer daqui para frente

Eu como homem da casa sempre preciso estar com a cabeça boa. Senti que nos últimos meses e, principalmente no último jogo, minha família estava sofrendo muito. Outro dia cheguei e nós quatro começamos a chorar. Pensei que acabou. O futebol te leva a ficar muito longe da família. Consegui fazer 500 e poucos jogos no profissional. São em média mil dias fora de casa, quatro anos sem estar com eles. Todos precisam de mim, vou tentar recuperar esse tempo que não pude ficar com eles. Mas a maior causa disso é a lesão. Se não machucasse eu continuaria jogando. No momento que não sou útil não dá mais. O esporte é assim. Não me sinto á vontade sem render o que rendi a vida toda. Estou feliz pela decisão que tomei, mas triste por não ter conseguido jogar no Botafogo o que joguei a minha carreira toda. Não conquistei coisas importantes dentro de campo, mas fora acredito que consegui passar um profissionalismo para os meninos. Algo para levarem para a vida toda –
Eu pensava em jogar um pouco mais. Sou um cara de cabeça boa, sei o que estou fazendo. Nesse momento vou procurar descansar. Tenho projetos com meu empresário, amigos do futebol. Mas não gosto de fazer as coisas apressadas. Por exemplo, se quero ser treinador não vai ser de um dia para o outro. Tenho que estudar, me preparar. A vida toda fui jogador, não sei fazer outra coisa. Vou tirar uns meses para esfriar a cabeça. Depois vou ver o que fazer. Ainda não sei se vou trabalhar com futebol, mas vou me preparar para fazer o melhor, independente do que seja.

 

Sensação estranha; culpa do calendário

Difícil. Como jogador, é a última vez que você chega em um estádio, concede uma entrevista. Eu gosto e respeito o lugar de cada um. O protagonista é o cara que entra em campo. Então passo a ser torcedor. Vou atender todos, com certeza, mas os protagonistas estarão em campo hoje à noite defendendo o Botafogo. Tudo que consegui foi jogando e sendo leal com o outro. Hoje tem um jogo importante, vou assistir e torcer por eles. Não quero tirar o foco, espero que o Botafogo conquiste uma vitória.
Talvez no começo. Eu tive uma conversa com o Jair e pensávamos que poderia ser o calendário. Então fizemos um preparação diferente. Mas fiquei treinando dois meses e meio, quando fui jogar atuei três minutos. É algo comigo, chamo a responsabilidade. Todos fizeram um grande trabalho comigo. O Jair não concorda que eu pare. Mas falei pra ele, fiz três períodos, na areia, piscina, entre outros e não deu. O corpo avisa. Não posso fazer mais o que fazia anos atrás.

 

Conversa com dirigentes e o apoio da família

Falaram para mim que eu poderia ficar à vontade tratando, sem pegar o salário e levando o tempo que eu precisasse para voltar. Mas fiquei treinando, não fiquei parado enquanto estava machucado. Não posso mudar isso. Eu entendo como se trabalha, Sei quando é falta de uma pré-temporada. Não é o caso. Sempre estava com a cabeça em ajudar o time, depois do último jogo isso mudou. Ficar aqui sem poder somar, não preciso. Nunca fiz isso. Fiquei sem força –
Não aceitaram. Ninguém aceitou. Tenho um amigo argentino que aceitou. Ele sabia o quanto eu estava sofrendo. Ele sofreu muitas lesões como eu. Ele sabia o que eu estava sentindo. Minha esposa sabia que eu estava triste, mas ninguém está dentro de mim. Como falei, fui egoísta e pensei em mim. Na minha vida toda sempre pensei no melhor para todo mundo. E agora pensei em mim.
>> Atenção aos filhos – Com certeza não vai ser fácil, é uma coisa que eu fiz a minha vida toda. No começo talvez seja mais fácil, como se estivesse saindo de férias. Tem que ver depois. Vou procurar ocupar minha cabeça. Tenho meu filho Santino, que precisa de muito tempo. Vou me dedicar a ele. Vou tentar dividir com a minha esposa essa responsabilidade. Acho que sou um cara preparado para enfrentar o que vier. Então a vida continua. Ninguém morreu deixando de jogar futebol, Vou sentir saudade, vamos organizar uma pelada para brincar um pouco.
>> Mudanças no futebol brasileiro – Eu acho o calendário do Brasil uma loucura, não existe. Em todos os outros lugares do mundo não é assim. Aceito que tem o Estadual, ajuda os atletas que não têm oportunidade de jogar outras competições. Mas para o jogador de Série A é complicado. O Botafogo joga quarta e domingo há dois meses. Acho que todo time tenha a mesma preparação. Esse ano tivemos 10 dias de pré-temporada, outros tiveram 30. No começo tivems umas 10 lesões. Então é difícil voltar e já jogar uma competição de nível. Então acho que a mudança principal é o tempo de preparação, porque depois cai na conta do preparador físico. Mas não dá para exigir, o cara não é mágico pra preparar uma atleta em 10 dias.

por Jota Carvalho

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