Economia brasileira dos últimos seis meses não é a mesma da última década

*Prof. Me. Eli Borochovicius
*Prof. Me. José Antônio Vidotti

Em 2015, a população brasileira atingiu a expressiva marca de 204,4 milhões de pessoas, representando crescimento de 10,42% nos últimos 10 anos, de acordo com os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Uma grande parte desse número é representada pela População em Idade Ativa (PIA), que compreende pessoas entre 15 e 64 anos de idade, composta principalmente por empregados e empregadores, pessoas que trabalham por conta própria, estagiários e aprendizes, desempregados em busca de recolocação no mundo do trabalho e licenciados pelo INSS.
Destaque para um aumento não expressivo, mas de grande relevância, no percentual do PIA, de 66,11%, em 2005, para 68,92%, em 2015, ou seja, o número de pessoas com idade suficiente para contribuir para a movimentação e dinâmica na economia aumentou. Apesar de estarem enquadradas no perfil das pessoas em idade economicamente ativa, nem todas, no entanto, possuem receita financeira.
No início de 2005, a população empregada era de 19,1 milhões e, em 2015, são 23,22 milhões de pessoas trabalhando. Os dados da Trading Economics mostram que nos últimos 10 anos, mais brasileiros passaram para a condição de potencial consumidor.
Essas pessoas passaram, também, a ser mais bem remuneradas. Uma forma de medir o crescimento de receitas dessa população é por meio do salário mínimo federal. Em 2005, o salário mínimo era da ordem de R$300,00 e, em 2015, R$788,00, portanto, o crescimento nominal foi de 162,67%, com aumento real de 46,35%, descontada a inflação no período.
A população em idade ativa cresceu, os números revelam que a população empregada foi ampliada e os salários aumentaram, mas assim como houve o aumento de receitas, o custo de vida seguiu a mesma trajetória e os preços subiram.
A inflação pode ser medida por diversos índices e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) parece o mais apropriado para essa análise, dado que fora criado com o objetivo de orientar os reajustes de salários dos trabalhadores. O índice abrange as famílias com rendimentos mensais compreendidos entre um e cinco salários-mínimos em ampla abrangência geográfica. São considerados os gastos com alimentação e bebidas, transporte, habitação, saúde, despesas pessoais, vestuário, comunicação, artigos de residência e educação.
No ano de 2005, o INPC apresentou 5,05%, já em 2014, a inflação fechou o ano em 6,23%. A análise dos dados históricos nos permite identificar que, nos últimos 10 anos, a inflação acumulada foi de 79,48%, ou seja, houve aumento real de receita para o trabalhador já que o salário mínimo aumentou percentualmente mais que a inflação.
Os números percentuais, no entanto, não podem ser vistos de forma isolada. Uma família que vive em 2015 com um salário mínimo de R$788,00, gasta mais de R$300,00 apenas com alimentação.
O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) apresenta mensalmente uma pesquisa de preços médios da Cesta Básica de Alimentos (CBA) e os números indicam que, no início de 2005, o preço médio estava em R$149,60, representando 50% do salário mínimo, já em 2015, R$322,61, comprometendo o orçamento familiar em 41%.
Os recursos financeiros excedentes de um trabalhador remunerado pelo salário mínimo nacional somariam, em 2015, considerando os custos com alimentação, R$465,39, que deveriam servir para o pagamento de aluguel ou prestação da casa própria, água, energia, gás, transporte, internet, cursos, livros, revistas, jornais e lazer. O que é impraticável com os preços atuais.
Apesar de os números parecerem favoráveis, é possível concluirmos que nos últimos 10 anos o brasileiro melhorou sua condição financeira, mas insuficiente para que tenha boa qualidade de vida.
Do início do ano para cá, no entanto, os números são desanimadores. A taxa de crescimento vem reduzindo ano a ano. Se em 2006 a PIA cresceu 1,68%, em 2015 o crescimento foi de apenas 1,15%. A população empregada caiu de 23,22 para 22,76 milhões de pessoas, portanto, houve aumento do desemprego. O indicador de inflação chegou ao elevado e preocupante patamar de 5,99%. A cesta básica sofreu aumento de 9,77% e temos percebido também o aumento nos preços das tarifas de água, energia e combustível, que refletem no aumento geral de preços e não estão contemplados no INPC.
Em função desse cenário, o consumidor brasileiro passou a se endividar mais e ampliar o seu grau de comprometimento de renda. Para a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), que apresenta, desde 2010, a Pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), no início de 2015 eram 57,5% de endividados e no mês de maio, esse número subiu para 62,4%. Dentre os endividados, 21,9% possuem o valor da parcela da dívida superior a 50% da renda familiar.
Há de se considerar, porém que nem todas as dívidas são ruins, o endividamento para o financiamento imobiliário com baixas taxas de juros em longo prazo, por exemplo, cria a possibilidade de estabilidade e segurança familiar.
O problema se dá quando as famílias não suportam os altos custos promovidos pela inflação e passam a não arcar com as suas responsabilidades financeiras, passando de endividadas para inadimplentes.
A Serasa Experian publica um indicador de inadimplência do consumidor e o número de inadimplentes cresceu 2,56 vezes nos últimos 10 anos. Somente em 2015 o número de pessoas com dívidas atrasadas junto a financeiras, bancos, cartões de crédito, empresas não financeiras e com cheques devolvidos por insuficiência de fundos cresceu 5,97%.
Outros indicadores como variação negativa do Produto Interno Bruto (PIB), altas taxas de juros e queda no indicador da Intenção de Consumo das Famílias (ICF), quando analisados conjuntamente com o emaranhado de dados estatísticos já apresentados, são suficientes para representar um cenário econômico perturbador, motivo pelo qual o momento é de cautela e de preservação do capital, evitando gastos desnecessários e ensejando a cultura do não desperdício.

*Prof. Me. Eli Borochovicius e Prof. Me. José Antônio Vidotti, docentes da disciplina de Finanças do Centro de Economia e Administração (CEA) da PUC-Campinas.

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