Prefeito quer rasgar história de Belford Roxo

Com quase todos os vereadores em seu favor, prefeito Waguinho tem tomado medidas polêmicas na cidade
Reprodução de Internet

Considerado pela população como “o exterminador do passado”, de Belford Roxo, o prefeito Wagner Carneiro (PMDB), o Waguinho, segue firme na escalada de destruição dos principais símbolos históricos da cidade. Ele já transformou em pó, marcas da emancipação e até das primeiras obras que marcaram a mudança do município, dos tempos do descaso e do fracasso público para o progresso.
Além de derrubar o pórtico da cidade, seus projetos mudam o brasão, o nome do Hospital do Joca, a data do feriado do Dia do Joca, destruiu creches, posto de saúde, praças de vários bairros, arrancou árvores centenárias, criou lei que aumenta de 15 dias para dois anos, o prazo de posse do seu vice. Enfim, Waguinho faz o que tem vontade, por ter nas mãos, sob seu controle, 24 dos 25 vereadores.
Na tentativa de barrar a sede do prefeito Waguinho, de exterminar o passado de Belford Roxo, o vereador Cristiano Santos Hermógenes (PTB), considerando que muitos dos atos do governo “são lesivos ao município”, e que “existem outras prioridades”, entrou com, pelo menos, 22 ações no Ministério Público e no Tribunal de Justiça do Estado. As ações são contra a destruição do pórtico, além de três prédios em perfeito estado de conservação, os quais abrigavam uma creche, um posto de saúde e um centro de convivência de Heliópolis. A praça do bairro, que também virou pó, assim como as de São Vicente, a do Sargento Roncali e a do Farrula, onde a prefeitura arrancou um exemplar de pau-brasil plantado por alunos.
Ainda de acordo com o parlamentar, em outros atos desfavoráveis ao verde, o prefeito teria mandado arrancar mais de 100 árvores, algumas centenárias, sem ouvir o Conselho de Planejamento e Gestão da Cidade. Além disso, teria usado verbas da educação em compras de material administrativo, placas de sinalização e banners; jogou lixo no rio Botas, e ainda mudou as cores da cidade; autorizou serviços sem licitação, como a compra de livros didáticos em empresa sem endereço fixo, bem como teria gasto dinheiro público na reforma do hospital infantil, que é privado. O prefeito também cancelou um contrato de iluminação pública e fez outro com valor de R$ 1,2 milhão a mais que o anterior. Em outra canetada, acabou com o vale-transporte, o auxílio alimentação dos servidores e mudou o brasão da cidade sem consultar a população, como determina a lei.

 

Câmara submissa ao prefeito

Diplomado, vice-prefeito eleito, Márcio Canella (direita), não assumiu seu mandato
Reprodução de Internet

Waguinho usou seu poder político sobre a Câmara Municipal, na qual controla 24 dos 25 vereadores, para alterar o artigo 79 da Lei Orgânica do Município (LOM), beneficiando o seu vice, Márcio Correia de Oliveira, o Márcio Canella. Ele é deputado estadual, eleito pelo PSL com 34.495 votos. A lei determinava o prazo de até 15 dias para posse do vice e do prefeito, a contar do início do mandato (1º de janeiro). Mas no lugar deste, foi aprovado outro artigo que aumenta para dois anos o prazo do vice assumir o cargo.
Com a alteração, Márcio teria tempo suficiente para disputar a reeleição de deputado em 2018 e, em caso de derrota, estaria apto para assumir o posto de vice. Ou seja, não ficaria sem mandato. Mas, como o ato fere a Constituição da República, a Justiça barrou a manobra, por meio de medida liminar, no dia 31 de julho. O vice não tomou posse e, sendo assim, já teria perdido a vez de assumir.

 

Descontração legislativa

São poucos os que acompanharam a volta ao trabalho dos vereadores
Davi de Castro/Jornal de Hoje

A equipe do Jornal de Hoje, na manhã do dia 8, acompanhou a abertura dos trabalhos da Câmara, com a presença de 23 dos 25 vereadores, após o recesso parlamentar (férias da turma) de 30 dias. Durante pouco mais de 30 minutos de sessão, onde se aprovou tudo sem debater nada, (talvez seja esse o motivo de pouca gente plateia), foi possível observar o clima de liberdade do poder legislativo. Poucos estavam vestidos a caráter. Alguns de manga de camisa, outros de paletó, mas sem gravata. Da tribuna, elogios rasgados a apenas duas figuras públicas: o presidente da Casa, vereador Márcio Cardoso Pigniez, o Marcinho Bombeiro; e o prefeito Waguinho.
Francisco Jucier, o ZZ da Crajubar, elogiou o presidente pelo “conforto da Câmara”, depois das obras no período do recesso. “Parabéns, presidente”, exaltou Rodrigo Ferreira Frasco (Rodrigo com Força Total). “Em sete meses a gente sente que o dinheiro do povo está sendo usado para o povo”, escancarou Frasco. “Waguinho só tem dois olhos e não pode ver todos os problemas da cidade”, bradou Ericsson Gláucio Ribeiro de Lima, o Ericsson Gal. Na plateia, a estudante Sandra Silva, 27 anos, não gostou do que assistiu. “A sensação é a de que o povo jogou o voto fora. Esses caras, juntos, tiveram mais de 50 mil votos (59.773 votos)… aqui só tem puxa-saco”, disse a moça, ao deixar o prédio.

 

Presidente da Câmara apoia mudanças do prefeito

Símbolo maior da cidade, o pórtico de Belford Roxo foi derrubado a mando de Waguinho
Reprodução de Internet

Por causa da destruição de símbolos e obras que marcam a história de Belford Roxo, construídas pelo ex-prefeito Joca, o atual, Waguinho, ganha fama de “o exterminador do passado”. Porém, Marcinho Bombeiro não concorda. “Não há interesse em apagar o nome do Joca da história e não há nada de mais em destruir o portal, mudar o brasão da cidade, trocar o nome do hospital, a data do feriado. Trata-se de nova gestão e o Waguinho quer dar uma cara nova ao município. E aqui tem muito feriado e ainda queriam outro para Maria Lúcia (ex-prefeita, esposa de Joca, falecida em 2012). E o nome do hospital (Jorge Júlio Costa dos Santos) fica parecendo que é do Joca. É melhor como Hospital Municipal de Belford Roxo. Agora, mexer na letra do Hino, por enquanto, é só especulação. Não chegou mensagem aqui na Câmara”, pondera o presidente.

 

Cuspindo na história

A moradora Fátima Medeiros, 47 anos, pensa bem diferente do vereador Marcinho. “Eles (referindo-se ao governo Waguinho) querem cuspir na história, acabar com ela. Joca é um mito aqui. Eles querem acabar com a memória da cidade, as marcas do Joca”, assegura. Nas ruas, o sentimento de muita gente é o mesmo de Fátima. “O prefeito decretou calamidade financeira em janeiro. Então, como é quem tem dinheiro para fazer portal novo, moderno e outras coisas?”, questiona Berenice Cândido Silveira, 35 anos. “Estão querendo mesmo é apagar tudo que o prefeito Joca fez para melhorar nossa cidade. Mas ninguém vai apagar nossa memória sobre ele”, completa.

 

População sugere outras prioridades

De acordo com o decreto nº 4.187, de 2 de janeiro, o prefeito Waguinho determina “racionalização do gasto público” e, seis meses depois, em 23 de junho, ratifica a prorrogação do decreto nº 4.194, de 6 de janeiro, que estabelece o “estado de calamidade financeira” do município.
Pelas medidas do governo, a vida financeira da cidade não anda nada boa, motivo gerador da publicação dos referidos decretos. Além disso, Belford Roxo tem problemas crônicos em várias áreas. Dos 1007,11 quilômetros de ruas existentes no município, por exemplo, 368,35 km (36.57%) estão sem saneamento básico e asfalto.
Na educação, 3.8% das crianças e adolescentes em idade escolar estão fora de sala de aula e a nota do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) é de 3.5% e 406.738 mil habitantes (do total de 494.141) são alfabetizados.
Enquanto isso, nas ruas a população diz não ser contra a mudança para a modernidade, mas considera que a obra do pórtico poderia esperar e o governo mirar em outras prioridades. “Ao invés de destruir o que está pronto, o governo deveria economizar e buscar soluções para áreas mais necessárias como saúde, educação, iluminação pública e saneamento básico”, avalia a dona de casa Clarice Moreira Santos, 59 anos.

 

por Davi de Castro (davi.castro@jornalhoje.inf.br)

error: Conteúdo protegido !!