Viúva de PM morto em Nova Iguaçu preferia que ele fosse pedreiro

O cabo Thiago Rodriguez da Silva, de 32 anos, encontrado morto dentro do próprio carro, na terça-feira, em Nova Iguaçu, havia se matriculado recentemente em um curso de graduação em Relações Públicas na Universidade Estácio de Sá. De acordo com a viúva, de 29 anos, que é gari e pediu para não ter o nome divulgado, ele iniciaria as aulas na próxima segunda-feira.

O corpo do PM, que era lotado na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) Tabajaras, foi achado no porta-malas do veículo, na Rua Leonardo Sender, no bairro Jardim Nova Era, próximo da casa onde morava. Thiago é o 98° PM morto no Rio só este ano e deixa três filhos, de 15, 14 e 4 anos.

“Vou ter que trancar a matrícula do meu marido que nem começou a estudar. Estou revoltada. Estou com nojo de morar aqui. Ele é mais uma vítima desse estado falido. É mais uma esposa que fica sem o marido. São mais filhos que ficam sem pai. Mais uma família que vai passar as festas sem um membro”, desabafa a viúva.

As primeiras informações da Polícia Civil indicam que Thiago foi abordado quando saía de casa. Agentes investigam se o PM tinha divergências com criminosos que queriam montar uma boca de fumo nas redondezas. De acordo com a viúva, o crime aconteceu a uma quadra da creche onde estuda o filho mais novo do casal.

“Os professores ouviram os tiros. Quando meu filho de 4 anos perguntar sobre o pai, o que eu vou dizer? — indaga a gari, que tem medo de voltar para casa. “Estou desde ontem fora de casa, dependendo da ajuda de parentes e amigos, que são aqueles com quem eu posso contar. Quando o governador ficou doente foi internado no melhor hospital. O que o estado pode fazer por minha família, que está toda em risco?

Thiago estava na corporação há sete anos e sempre atuou em UPPs, de acordo com a família. Antes de ser policial, ele trabalhava como peão de obras. Um de seus serviços foi no calçadão de Nilópolis, colocando as pedras portuguesas no caminho. Para economizar o dinheiro que gastaria no transporte, fazia de bicicleta o trajeto de casa, em Nova Iguaçu, até o trabalho, no município vizinho.

“Antes ele tivesse continuado a trabalhar como pedreiro, pedalando de casa até o trabalho. Pelo menos estaria vivo e me ajudaria a criar os filhos”, diz a viúva.

O primeiro serviço de Thiago como policial foi na UPP Dona Marta, em Botafogo. Segundo a viúva, o PM gostava do trabalho e evitava fazer comentários sobre sua rotina.

“Felizmente ou infelizmente, ele não trazia esses assuntos para casa. Gostava do que fazia. Mas a gente sabe a situação que eles vivem. São viaturas sem combustível, armas sem manutenção. Se eles dispararem uma bala precisam fazer um relatório enorme”, diz a gari.

A viúva conta que evitava acompanhar os relatos e depoimentos de viúvas de policiais mortos.

“Eu sabia que a qualquer momento poderia ser a minha vez. Por isso, não gostava nem de ver”, conta.

Policiais da UPP foram ao IML ajudar a família do PM a liberar o corpo Foto: Pedro Zuazo

Sobre a mudança anunciada pelo secretário de Segurança, Roberto Sá, que vai deslocar três mil homens de UPPs para as ruas, a gari não deposita esperanças.

“O que vai mudar? Os policiais vão continuar trabalhando em péssimas condições. As UPPs serão esvaziadas e os bandidos vão se proliferar nos morros. É preciso dar mais liberdade de ação para os policiais. E não adianta nada eles prenderem e depois os bandidos serem liberados em indultos”, diz a viúva.

Na manhã desta quarta-feira, policiais da UPP estiveram no Instituto Médico Legal (IML) de Nova Iguaçu para ajudar a família com a burocracia na liberação do corpo do PM. O corpo de Thiago será sepultado às 11h desta quinta-feira, no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap, na Zona Oeste da cidade.

 

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