Pátria Amada erotizada

*Maria José Rocha

O Brasil, nesses dias de revolução sexual, ainda que tardia, vem assistindo a verdadeiros espetáculos sexuais de caráter quase primitivos protagonizados pelos queridos compatriotas, que dão sinais de uma espécie de retrocesso civilizatório. São tantas e tão desumanas as “novidades excessivas” que, ao assistirmos o noticiário, duvidamos que possam ter lugar em pleno século XXI. Como se não bastasse a inspiradora realidade violenta, também a virtual incita ao crime. Acabo de assistir na Globo a bela atriz Juliana Paz, que interpreta a “apaixonada” mulher do traficante Rubinho, despejando pétalas de rosas vermelhas de um helicóptero, dizendo, aos berros, que o amava. Os brutos também amam e o crime compensa.
A violência, inclusive sexual, tornou-se tão banal que é difícil imaginar uma barbaridade, uma prática sexual violenta e pública que não encontre um lócus na ordem dos fatos.
Moral e psicologicamente, é terrível que tenhamos ficado tão “desembestados”, como bem descreveu o delegado e escritor Miguel Lucena. Para ele, “o mal se alastra. A negação da autoridade – em que tudo tem de ser provado perante o interlocutor, como se nada existisse antes – e a substituição da busca da virtude individual pelo prazer a qualquer custo criaram um contingente de pessoas sem freios morais, os desembestados, capazes de praticar toda sorte de indignidades para alcançar seus objetivos, o que tem provocado o descontrole da criminalidade no Brasil”.
O noticiário se tornou traumático: uma hora é um bebê abusado sexualmente pelos próprios pais nas dependências de um motel; outra, é um ejaculador que ataca mulheres na via pública, em São Paulo, e depois de preso pela polícia é solto pela justiça; diariamente são inúmeros os casos de violência sexual praticada no interior dos lares contra crianças, ensangüentando as páginas de jornais, em todo o país; e até a emblemática nudez de um artista na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, provoca ainda mais transtornos na ordem pública e uma querela jurídica, que logo foi resolvida pelo governador do DF, que disse ao nu que ficasse.
Falo da ascensão e queda da civilização, se é que já tivemos ascensão à civilização, porque pelo menos para Freud “a construção da cultura/civilização se dá a partir do abandono dos instintos humanos: a sexualidade e a agressividade. Isto é, renúncia ou repressão das satisfações primitivas constitui pré-requisito para a vida em sociedade”.
A cada novo episódio de violência sexual, as autoridades se mobilizam para alterar os códigos de leis. É triste a situação de uma sociedade em que todas as suas práticas, inclusive as sexuais, precisem ser reguladas pelo estado. Quem sabe, se houvesse educação, família, religiões verdadeiramente organizadas, fortalecidas, eficientes e fecundas, tivéssemos o fortalecimento do intelecto e a dominação dos instintos?
Freud já nos dizia que a “nossa civilização repousa, falando de modo geral, sobre a supressão dos instintos. Cada indivíduo renuncia a uma parte dos seus atributos: a uma parcela do seu sentimento de onipotência ou ainda das inclinações vingativas ou agressivas de sua personalidade. Dessas contribuições resulta o acervo cultural comum de bens materiais e ideais. Além das exigências da vida, foram sem dúvida os sentimentos familiares derivados do erotismo que levaram o homem a fazer essa renúncia, que tem progressivamente aumentado com a civilização. (Freud, 1908/1974, p. 192).
A revolução sexual deveria ser resultado de um processo de educação, desde a primeira infância, e não um instrumento de manipulação de personalidades políticas narcísicas, que se valem da subescolarização e da exacerbação da sexualidade para dialogar com os que vivem em conflito com os valores culturais: delinquentes, drogados, psicóticos/loucos e subversivos de ocasião, expondo as pessoas trabalhadoras, expondo as pessoas de bem à situação de insegurança, de medo, a uma clandestinidade a céu aberto.

*Maria José Rocha é mestre e doutoranda em Educação. Ex-deputada, preside a Casa da Educação Anísio Teixeira.

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