Moro propõe acabar com foro até para magistrados

“Minha maior frustração seria tudo o que fizermos não ir adiante”, disse o juiz em fórum de debates promovido pela Revista Veja
Gil Ferreira / ABr

O juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato na primeira instância, em Curitiba, citou ontem (27), falhas legislativas que, segundo ele, permitem a corrupção, como o foro privilegiado e a falta de barreiras ao loteamento das estatais, como sua maior frustração desde o início da operação, em 2014. “Minha maior frustração seria tudo o que fizermos não ir adiante”, disse.
Ao participar de fórum realizado pela Revista “Veja” em São Paulo, Moro defendeu o que chamou de “Plano Real contra a corrupção”, referindo-se, disse, a um plano considerado tanto pela direita quanto pela esquerda como bem-sucedido no enfrentamento da hiperinflação.
O juiz disse que é preciso ir além da redução do foro privilegiado e eliminar por completo essa prerrogativa, inclusive a magistrados. Afirmou também que é preciso criar bloqueios legislativos ao loteamento político das estatais, que levou às indicações políticas que permitiram desvios em empresas públicas como a Petrobras.
“O que se verifica é a quase completa omissão da classe política em promover medidas dessa espécie”, declarou. Segundo Moro, a atuação única do Judiciário é insuficiente para resolver o problema e considerou ser uma grande responsabilidade colocar nas costas da Lava Jato a tarefa de reduzir a corrupção no Brasil. “Eu tinha a expectativa de que o tratamento (dos escândalos de corrupção) não ficasse restrito a cortes da Justiça”, disse.
Moro avaliou que as eleições do ano que vem serão uma oportunidade de mudança na política e considerou que, ainda que as agendas econômica e social sejam importantes, o combate à corrupção precisa estar no centro do debate. Disse ter curiosidade sobre o que pensam os potenciais candidatos a respeito do foro privilegiado e do loteamento das estatais. “É preciso que quem postule tenha respostas a essas questões”.
Moro reafirmou que não pretende disputar qualquer cargo público porque isso colocaria em dúvida todo trabalho feito por ele até o momento. Disse que uma candidatura seria inapropriada neste momento e que também não vê essa possibilidade ocorrer no futuro. (AE)

“Estou especialmente tranquilo
com tudo o que eu fiz”

Sérgio Moro afirmou que “todo caso criminal de grande dimensão (como o de Lula) envolve cuidado”
Expresso

O juiz disse que não lhe ocorre nada de muito significativo na condução do processo de julgamento de um dos maiores escândalos de corrupção do País que o faria agir diferentemente da forma com a qual se procedeu até agora.
Ele fez a afirmação ao ser indagado durante o evento da Veja, batizado como “Páginas Amarelas ao Vivo” se existia alguma coisa da qual se arrepende ao longo da sua atuação na Lava Jato. “Estou especialmente tranquilo com tudo o que fiz”, disse o juiz.
Sobre o episódio da polêmica divulgação dos áudios de conversa entre a presidente cassada da República Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o magistrado disse que não esperava tanta repercussão. “A divulgação dos áudios foi controversa. Não esperava tanta celeuma, mas fiz o que a lei exigia e era necessário”, disse Moro.
Para ele, o diálogo entre os dois ex-presidentes não era conversa republicana e que entendeu naquele momento que a sociedade precisava ter conhecimento do teor daquelas gravações. “O problema não foi a divulgação, foi o conteúdo do diálogo”, disse acrescentando que não divulgá-lo seria como se a suprema corte americana tivesse deixado o ex-presidente norte-americano Richard Nixon ficar com as fitas no Watergate, o escândalo político ocorrido na década de 1970 nos Estados Unidos que, ao vir à tona, acabou por culminar com a renúncia do presidente eleito pelo Partido Republicano.
“Havia interesse público na divulgação daquele diálogo”, disse Moro. Ele ponderou, no entanto, que o Judiciário é uma instituição humana conduzida por humanos e, portanto, sujeito a erros. Mas emendou que o importante é que os juízes procurem sempre agir em conformidade com a lei. “Juiz pode cometer erros, o importante é agir conforme a lei”.
Perguntado sobre o fato de ter voltado atrás na recusa de andar com segurança após ter determinado a condução coercitiva do ex-presidente Lula, Moro disse que fez depois de ter ataques inclusive contra sua família. “Não esperava alguns ataques sujos por conta desses processos que envolvem políticos. Existe tentativa de diversionismo. Ao invés de discutirem minhas responsabilidades, atacam os responsáveis pelo processo”, disse. “Não vou ficar me incomodando com mentiras”, afirmou.
Ao ser provocado novamente a falar sobre o ex-presidente, Moro disse que o único processo a que Lula responde é o caso que ele julgou e que se encontra em fase de apelação em segunda instância. “Podem absolver como manter a condenação. Minha sentença já prolatei. O caso está em outras mãos, certamente melhores que as minhas.”
Sobre as críticas de alguns setores da sociedade a um excesso de cuidado do juiz no caso Lula, Moro disse que todo caso criminal de grande dimensão envolve cuidado. “Não só o dele como também do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. Não me sinto confortável em falar do caso dele que tem discussão política. Tudo que tinha para dizer sobre esse caso está em minha sentença”, disse. (AE)

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