Estudantes americanos dão exemplo do que se pode fazer

*Sílvia Caetano

Na seqüência da tragédia da escola Marjory Stoneman, Florida, onde 14 adolescentes e três adultos foram assassinados a tiros pelo ex-estudante Nikolas Cruz, chegou às livrarias, em Portugal ,o livro “ Fogo e Fúria”.Best-seller do momento nos Estados Unidos, foi escrito pelo jornalista Michael Wolff , tornou-se sucesso instantâneo e deixou Trump à beira de um ataque de nervos.
O livro o apresenta como o mais despreparado de todos os ocupantes da Casa Branca. Mas o jornalista explicou que não expôs suas idéias a respeito do Presidente mas opiniões de pessoas à sua volta,que o consideram incapaz de governar.O único fato que admitiu como positivo em Trump,” é que ele vende”.Dai,pode-se concluir, o livro.
No mesmo final de semana, jornal português Expresso publicou entrevista do jornalista Charles McGrath, do New York Times,com Philip Roth,um dos grandes escritores do século XX e dos mais lúcidos da historia da literatura,onde ele também comenta a figura de Trump.Roth,com 85 anos e que deixou de escrever aos 78,continua observador da cena norte-americana.Ele comparou Trump ao piloto Charles Lindbergh, que atravessou sozinho o Atlântico em 1927 e é personagem do seu livro “A Conspiração Contra a América “,onde se torna Presidente da República.
Lindbergh era racista, anti-semita , supremacista branco,com simpatia pelo fascismo e nos anos 30 liderou um movimento isolacionista também chamado “América First.Contudo, Roth considera que devido ao seu vôo transatlântico tornou-se autêntico herói americano,o que já não pode dizer sobre o atual Presidente dos Estados Unidos . “Por comparação, Trump é uma fraude maciça, a soma maligna das suas deficiências,destituído de tudo,exceto a ideologia oca de um megalomaníaco,” enfatizou.
Ou seja,Trump continua nas folhas,sempre por razões pouco dignas.Agora deverá enfrentar uma oposição inesperada,liderada pelos jovens, que não aceitam continuar sendo assassinados dentro das escolas por causa da falta de controle do governo sobre a venda de armas.Por essa,Trump jamais esperou.
Poucos dias após a chacina dos jovens alunos,dois deles,Emma Gonzàles,18 anos, e David Hogg,17,disse a colegas,familiares e professores que estiveram numa manifestação a favor do controle de armas,sábado passado,em Fort Lauderdale,Florida, que a conversa dos últimos 25 anos dos congressistas sobre o assunto é “bullshit”.Ou seja,para eles,tentar reduzir o problema à saúde mental e à insegurança nas escolas,como Trump procura fazer,não passa de conversa para boi dormir.
E foi isso que disseram na cara do Presidente Donald Trump e aos congressistas.Num emocionado discurso,nada parecido à fala de ocasião dos bajuladores políticos,interrompido por aplausos e transmitido para o mundo pelas televisões e smartphones,Emma disse que “ se tudo que o nosso governo e nosso Presidente podem fazer é rezar,então chegou a hora de as vítimas fazerem as mudanças que precisamos.”
A cena,que se tornou viral em segundos,mostrou um abobalhado Trump segurando uma “ cola” nas mãos,captada pelos fotógrafos,com cinco pontos preparados pela sua assessoria para mostrar empatia com os estudantes e família dos menores assassinados.Ele nem teve coragem de lê-los e disse as platitudes de sempre.O discurso terminou como uma espécie de manifesto dos mais jovens contra todos os setores que se opõem à falta de controle da venda de armas. Eles parecem saber o que querem e prometem lutar para denunciar congressistas “ que se sentam ma Câmara e no Senador em cadeiras douradas financiadas pela Nacional Rifle Association – NRA-“ a poderosa entidade que representa a indústria do armamento.
Segundo levantamento realizado pelo jornal Washington Post ,somente nas eleições de 2016, a NRA ofertou 3.534.294 doláres a 49 senadores e a 258 dos 435 deputados.Torna-se evidente porque até hoje nenhuma medida efetiva para restringir a venda de armas no país prosperou no Congresso dos Estados Unidos.Mas os jovens norte-americanos estão dispostos a mudar a situação,pressionando os parlamentares a altera as leis de controle de armas.
Eles estão se mobilizando em todo o país e ameaçam não voltar às aulas enquanto nada for feito. Não há um só dia em que não se manifestem,sempre com cobertura da mídia.Campanhas para reunir donativos estão em curso e já está marcada para março uma grande marcha em Washington e em diversas cidades norte-americanas para pressionar o Senado e a Câmara.
É comovente ver como esses jovens estão se revoltando contra um estado de coisas que poucos acreditam possa ser alterado,mas sempre há um David para enfrentar o filisteu Golias.Quem sabe nossos jovens poderão imitá-los e lutar pela moralização da vida pública brasileira.Agora mesmo há um bom motivo.
O Supremo Federal já havia aprovado o fim do financiamento das eleições pelas empresas.Mas como os políticos brasileiros sempre dão um jeito de burlar a lei,criaram um Fundo Partidário de bilhões para ajudá-los a conquistar mandatos.Pode parecer medida democrática,mas vale a pena ir olhar o balcão de negócios instalado na Câmara para compra e venda do passe dos deputados,que podem trocar de partido entre 8 de março e 6 de abril,sem perder o mandato.

*Sílvia Caetano é jornalista.

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