Canteiro central da Via Light vira abrigo para moradores de rua

Grupos de sem teto estão vivendo em tendas instaladas no canteiro central da Via Light, no Centro de Nova Iguaçu
Davi de Castro/Jornal de Hoje

O gramado do canteiro central da Via Light está sendo transformando em local de moradia de desabrigados pela sorte e de outros sem teto que perambulam pelas ruas de Nova Iguaçu. Tal qual os refugiados venezuelanos em Boa Vista (RR), várias tendas foram montadas, inclusive debaixo de algumas árvores.
Ao lado da casa/tenda, varal com roupas e dezenas de pessoas, entre homens, mulheres e crianças, todos alegres e sorridentes. Enquanto isso, alguns lavam roupas no valão central e outros cuidam fogões de lenha com panelas de lata, exalando a fumaceira, sinalizando que a comida está quase pronta.
A população de rua que assenta moradia embaixo de árvores, na extensão da Via Light, no centro de Nova Iguaçu, não paga água, nem luz e muito menos aluguel, e também não quer conversa com ninguém. Quando alguém se aproxima, é comum que moradores, jovens e até adultos se sintam ameaçados. “O que você quer com a gente… deixe a gente em paz”, afugentam. E se afastam rapidamente, avisando a outros moradores vizinhos: “Esse cara quer fotografar a gente”, alarma.
O comunicado, feito também através de sinais e assobios, circula com grande rapidez. “Ali é tudo de graça, pois moram no centro e não pagam IPTU ou taxa de iluminação, não pagam nada pela moradia privilegiada”, brinca uma moça que passa apressada pela calçada próxima dos desvalidos moradores.

Divisão das tarefas domésticas

O desconhecido que se aproxima da casa ou tenda, como a equipe de reportagem do Jornal de Hoje, é visto, sempre, como uma ameaça à permanência deles no local, onde fazem sexo a qualquer hora do dia, debaixo dos lençóis, e improvisam fogaréu de lenha sobre a grama, para fazer comida.
Na tarde do dia 17 de fevereiro (sábado), havia em uma das tendas, uma grande família ou grupo, com cerca de 10 pessoas, que se dividiam em tarefas. Um cuidava da comida, outro lavava roupas no valão que passa pelo centro do canteiro, construído para dar vazão aos alagamentos das ruas centrais, outro varria o local e uma quarta pessoa expulsava a equipe do JH, enquanto os demais, inclusive mulheres, cuidavam de crianças dentro e fora da tenda, ou conversavam animadamente.

Assaltos para comer e beber

Mas não é só na Via Light que a população de moradores de rua, de desabrigados ou desvalidos está crescendo, vítimas ou não da falta de proteção social. Em outros pontos centrais da cidade, a situação é a mesma, a exemplo da Praça da Liberdade (como mostrou recente reportagem do JH), passarela do Caracol, a pracinha em frente a Associação dos Ex-combatentes do Brasil e passarela da estação ferroviária. Inclui-se, ainda, dentre moradores destes locais, jovens delinquentes e usuários de drogas, pedintes, idosos e doentes.
Uma parte dessa população de rua dorme durante o dia e sai à caça da sobrevivência no final da tarde. Outros, não têm dia nem hora para sair em busca do que comer, beber ou roubar. “Na hora da fome, que é toda hora; e na hora da vontade de beber, entre essas pessoas há os que atacam quem passa e toma os pertences dos pedestres, para vender a preço de banana, seja telefone, dinheiro e até calçados e roupas”, comenta a estudante Julia Moreira Santos, 22 anos.

O temor de pessoas nas ruas

Procurados pela reportagem do Jornal de Hoje, muitas pessoas se negam a falar sobre a situação e muito menos aparecer em fotografias ou reclamar de questões sociais que envolvem a população de rua, a delinquência juvenil e o poder público. Mas dona Valéria Sampaio, uma comerciária de 60 anos, não se negou a dar declarações. Só pediu para não ser fotografada. “A Praça da Liberdade é um nojo e fede, pois eles (referindo-se à população de rua) comem, bebem, se embriagam, brigam, dormem e ainda fazem sexo na praça. Ninguém dá jeito nisso. Não tenho conhecimento de nenhuma ação ou projeto social da prefeitura contra esse tipo de coisas. O que vejo de vez em quando são grupos de crentes fazendo orações e distribuindo quentinhas (comida) ou pão e café com leite”, desabafa.
>>Sexo ao ar livre – Para a comerciária, a escuridão das ruas e travessas do centro da cidade permite que as pessoas que moram nas ruas, façam suas necessidades na calçada. “E, além disso, a escuridão facilita os assaltos”, diz Valéria, referindo-se às ruas Rosinda Martins e travessas Cocozza e Renato Pedrosa, e alguns cruzamentos da Via Light. “Aliás, você já viu que a Via Light está cheia de moradores? Outro dia passei pela calçada de uma academia e do outro lado havia um rapaz ‘enroscado’ (fazendo sexo) com uma moradora de rua, que reclamava muito, debaixo do cobertor, por não conseguir se livrar do cara. Todo mundo que passava, lamentava a cena”, comenta a comerciária.

por Davi de Castro – davi.castro@jornalhoje.inf.br

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