
O Detran quer que as aulas noturnas em autoescolas fiquem suspensas até 31 de dezembro, quando termina aintervenção federal na segurança do Rio. Durante audiência pública ontem na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), o presidente do órgão, Leonardo Jacob, comunicou que vai elaborar uma nota técnica com o pedido que será encaminhada ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). A medida foi tomada após instrutores e donos de autoescolas denunciarem à Alerj que têm sido vítimas de roubos e arrastões durante a noite. Desde 2010, uma lei obriga que futuros motoristas tenham aulas noturnas de direção.
O Detran informou que o Denatran já se comprometeu a encaminhar o pedido de suspensão à Casa Civil da Presidência da República em caráter emergencial. A medida seria tomada por meio de um medida provisória, para alterar o Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Em 27 de abril, o Detran já havia determinado a redução do número de treinamentos noturnos obrigatórios de quatro para um. Três podem ser realizados em sala de aula num simulador — espécie de videogame que reproduz experiência semelhante.
A instrutores e donos de autoescolas, o deputado Carlos Minc (PSB), presidente da comissão especial criada para acompanhar o cumprimento das leis (Cumpra-se!), afirmou que a expectativa é que uma resolução seja baixada pelo Denatran em 15 dias. A partir das reclamações, Minc já propôs um projeto de lei para regulamentar as aulas noturnas no Rio.
— Entramos com um projeto de lei que suspende esta obrigatoriedade durante a intervenção, pela manifesta falta de segurança. Instrutores e donos de autoescolas relataram inúmeros casos de roubo em São Gonçalo, além de sequestros em outras cidades. Há vários casos de veículos roubados em que os criminosos depois ligam para a autoescola exigindo resgate para devolvê-los — contou Minc.
Aulas noturnas são obrigatórias desde 2010
As reivindicações só chegaram à Alerj graças à mobilização de instrutores de São Gonçalo, cansados da rotina de assaltos. Eduardo Reis conta que a hora do trabalho virou sinônimo de estresse. Há dois meses, no bairro de Alcântara, ele teve o celular roubado por um homem que parou ao lado do carro quando ele ensinava uma aluna a fazer baliza.
— Ele chegou do meu lado, na janela, colocou o revólver para dentro e mandou que eu entregasse o celular. Nossa sorte foi que ele não pediu o aparelho da minha aluna, que havia esquecido o dela em casa. Se ela dissesse que não estava com o aparelho, poderia acontecer uma tragédia — conta.
Segundo Eduardo, o problema da violência durante instruções noturnas é antigo, mas acaba sendo negligenciado porque, na maior parte das vezes, os instrutores têm medo de fazer registros de ocorrência.
— É por isso que a Polícia Civil não consegue fazer um levantamento de casos e entender o tamanho do problema. A única saída que encontramos foi ir atrás dos parlamentares. A aula noturna é obrigatória em todo o país. Mas é de extrema necessidade discutir se vale expor os profissionais a esse risco e se essas quatro aulas noturnas são primordiais para o desempenho do candidato. Acreditamos que ele pode estar bem preparado somente com aulas diurnas — diz o instrutor.
Irwing Araújo, de 34 anos, era um dos donos de autoescolas que foram à audiência pública. Com lojas na Baixada Fluminense e na Ilha do Governador, ele conta que, só este ano, duas delas foram invadidas à noite. Numa das ocasiões, em fevereiro, houve tiroteio dentro da unidade.
— Tínhamos um aluno que é policial militar e reagiu ao assalto. Havia cerca de 30 pessoas dentro da autoescola, entre funcionários e alunos. Era por volta das 20h. Graças a Deus, ninguém foi atingido, mas é algo muito traumático — conta Araújo, que afirma que os casos de violência dentro das lojas aumentou exponencialmente desde o início da obrigação para que as autoescolas funcionassem à noite, em 2010: — Antes, até tínhamos instrução à noite, mas as lojas ficavam fechadas. Atualmente, a autoescola fica aberta, iluminada, cheia de gente dentro, porque os alunos tem que marcar as digitais. Em tempos violentos como esses, é um risco.
Outro problema denunciado pelos instrutores diz respeito a arrastões em locais de treinamento, que concentram uma quantidade grande de alunos e instrutores.Alexandre Muniz estava presente em um deles, em São Gonçalo. Ele era o último de uma fila de 12 veículos.
— Avistei um veículo parado, quando, de repente, eles já estavam apontando a arma para o meu aluno, querendo o celular. A minha reação foi dar o meu. O aluno ficou traumatizado, demorou para fazer a prova, mas ele passou, graças a Deus. Depois de roubar o carro de um colega, uma aluna demorou para entregar a bolsa e acabou levando um tapa. Eles estão agindo com agressão. Estamos atravessando uma fase complicada, os alunos estão com medo. Sou a favor da aula noturna, mas hoje está perigoso demais, somos presa fácil — disse.