Campinhos de peladas – Eu era feliz e sabia!

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*Jota Carvalho

Nos lugares que morei quando moleque de calça curta nunca rejeitei peladinhas nos campinhos. Ali, os ‘craques’ se esbaldavam! Duas lembranças fortes ficaram: os ‘rachas’ não tinham juiz e o dono da redonda, normalmente ruim de bola pra caramba, sempre se escalava no time do melhor jogador da parada. Outra marca era a gurizada com os pés no chão de barro ou terra preta. “Descalço era mais gostoso”, lembra o parceiro de correr atrás da ‘maricota’ de couro, ‘Zé Cabecinha’, batendo a casa dos 67 anos e ainda lúcido. Cabecinha dava um azar danado, pois era sempre o último a ser escolhido na formação dos times no par ou ímpar entre os dois craques. Os bons nunca estavam todos no mesmo ‘escrete’. Senão perdia a graça. Tinha cara ou coroa para escolher o lado e decidir qual time jogaria sem camisa. O pior de cada time virava goleiro, a não ser que tivesse alguém que gostasse de ‘catar’, ‘agarrar’. O Zé estava sempre na ciranda do cada um cata até sofrer um gol. “Era triste. Só dava eu ali embaixo dos paus amarrados de qualquer maneira”, relembra, ressaltando: “No caso de pênalti, saía o goleiro ruim e entrava um melhor, para tentar pegar a cobrança”. Os piores de cada lado jogavam na zaga para espanar o adversário e a bola para longe, nem que tivesse de buscar a mesma várias vezes no meio do mato – uma das ‘regras’.
Algum mais velho, com ares de treinador, ensinava a regra geral de todos os jogos: as faltas serão marcadas no berro. Se você levar um toco, grite como se tivesse quebrado uma perna. A falta será sua. Se você estiver no lance e a bola sair pela lateral, grite “é nossa” e pegue a bola o mais rápido possível para fazer a cobrança (esta ‘regra também se aplicava no caso de escanteio ou ‘córner’).
“Quantas vezes você destroncou o dedão do pé, ralou o joelho, sangrou pelo nariz e rasgou o calção, Cabecinha?”. “Isso era tão comum, que nem lembro”, respondeu.
Era normal, por exemplo, o time de camisa estar goleando por 7 a 0 e querer acabar o jogo, mas o lado descamisado, mesmo cansado, propor um acordo: quem fizer o primeiro gol leva a vitória para casa. A não ser que a mãe do dono da bola aparecesse na beira do campo com a correia de couro na mão e mandasse ele pra casa. “Chega de bola por hoje. Hora de tomar banho, se alimentar e fazer o dever de casa”, ordenava a senhora, aplaudida pelos ganhadores, claro.
Assim, a molecada deixava o campinho, não sem antes marcar um novo encontro para o dia seguinte, após a volta das aulas na escola pública. Isso era sagrado no meu, no nosso tempo de moleque. Saudade do Dé, Lilinho, Genú, Pardal, Carlinhos Barriga, Picolé, Cajú, Adilson Bronquinha, Demar, Dininho, Baianinho e tantos que se revezavam nas peladinhas. A maioria desses ‘craques’, hoje, bate bola, joga suas peladas no campeonato celestial.
Caro leitor: esta crônica fez você voltar no tempo, lembrar da infância? Então, você, como eu, foi uma criança normal e feliz.
*Jota Carvalho é cronista esportivo e repórter na empresa Jornal de Hoje desde 2008.

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