*Carlos B. Gonzáles Pecotche
O homem tem o costume inveterado de procurar estar a par de tudo, quer dizer, indaga sobre tudo para satisfazer sua curiosidade, preocupando-o quanto acontece no mundo inteiro. Este é um fato muito certo, como é também certo que de quem ele menos se ocupa é de si mesmo. Não nos referimos à sua aparência pessoal, nem à satisfação de suas ambições, pois nisso é generoso em excesso, mas sim à história individual, que cada um devia manter sempre em dia.
Não se deve esquecer que a vida humana está contida num grande livro, onde diariamente é registrado cada pensamento bom que se tenha ou cada obra de bem que se realize como também o que for mau, seja no pensar, no dizer ou no atuar. O homem, em geral, desconhece a existência desse livro, porque não se dá ao trabalho de registrar, em sua consciência, os próprios pensamentos, palavras ou ações. Se assim fizesse, veria com surpresa quantas mudanças ou quantas correções deveriam ter sido feitas no curso de seus dias. Saberia, então, julgar-se com uma justa apreciação de seus valores e não cairia, como tão facilmente cai, na sobre estimação de si mesmo, no ridículo dessa inflação.
Para se conhecer internamente, é necessária que a pessoa, a princípio, se faça uma formal apresentação, pois já é sabido que cada um dos seres é um simples desconhecido para si mesmo. Alguém poderá dizer que, ao fazê-lo, se vê diante de um ser mudo, que não sabe o que responder, entretanto, ele ali está, respondendo aos gritos por meio de tudo o que foi pensado e feito desde que nasceu neste mundo. Se for causa de desgosto o tempo que se perdeu e a miséria do trabalho realizado como ser inteligente e consciente, que então se controlem os pensamentos e a conduta mediante o ordenamento de uma nova e rigorosa disciplina, e que se consagre o tempo na recuperação das horas perdidas e na reparação dasfaltas cometidas, a fim de que a obra da vida seja uma obra de homens que souberam pensar e sentir. Que a tinta empregada para gravar nas páginas do livro os caracteres da própria história se transforme em ouro líquido, esse ouro que é a essência do pensamento vivo, manifestando-se nos traços e nos feitos mais honrosos, mais elevados e heroicos que o ser humano deve condensar nas páginas de seu livro pessoal.
Acontece, é bom ressaltar, que a maioria é constituída justamente dos que pensam mal e atuam pior ainda. Nem vale apena lhes falar sobre registrar, eles mesmos, seus pensamentos e suas ações. Como não têm a menor intenção de se corrigir, melhor é não levarem em conta nada que se relacione com eles próprios, pois isso seria expor-se a uma vergonha insuportável. Mas eis que – oh, sublime paradoxo! – os demais anotam tudo, sem omitir ponto nem vírgula. E como é geral essa atitude de fazer vista grossa, ela acaba sendo desculpada e tolerada, ainda que não muito de bom grado.
Quando chegará o dia, ficamos pensando, em que esse livro deixará de ser feito de metal vulgar, onde qualquer um rabisca os parágrafos que queira, para converter-se em livro de ouro, cujo autor seja um só, único e legítimo autor de sua própria história?
*Carlos B. Gonzáles Pecotche – Autor da logosofia – www.logosofia.org.br