
Fotos: Davi de Castro/Jornal de Hoje
O desrespeito ao Código de Posturas e a bagunça no uso do solo público em Nova Iguaçu, dão amostras um governo desorganizado e um gestor sem autoridade no município. Pois a lei nº 2112, em vigor desde 19 de dezembro de 1991, que deveria ser usada para todos, protege grandes comerciantes e expulsa os ambulantes do centro da cidade.
A farra dos infratores do Código de Posturas só veio à tona no dia 18 passado, quando um agente da prefeitura, identificado como Ricardo Quinzão, apreendeu salgadinhos que um jovem vendia em uma caixa de isopor sobre uma bicicleta, no calçadão da Avenida Amaral Peixoto. O ato revoltou dezenas de pessoas que passavam pelo local.
A reportagem do Jornal de Hoje percorreu as ruas centrais de Nova Iguaçu, onde o comércio é mais movimentado, e flagrou dezenas de irregularidades. No próprio Calçadão, lojas comerciais expõem mercadorias sobre tabuleiros nas calçadas e até no meio da rua, dificultando a passagem de pedestres. No cruzamento com a Avenida Nilo Peçanha, lojas travam uma ensurdecedora guerra de som entre elas, na disputa pela preferência dos clientes.
A exposição das mercadorias fere o artigo 80 do Código de Posturas, que proíbe obstrução do passeio público, e o volume de som contraria o artigo 72 do mesmo código. No cruzamento entre o Calçadão e a Nilo Peçanha é comum ver grupos de agentes da prefeitura, sem nada fazer. “A gente multa as lojas por causa de mercadorias nas calçadas. Eles preferem pagar a multa”, disse um deles. “Se a loja vende R$ 10 mil por dia, o dono não se incomoda em pagar R$ 1 mil de multa”, completa outro agente. Perguntados sobre porque não apreendem as mercadorias expostas de forma irregular, os agentes não responderam.
Salgadinho sobre rodas

Fotos: Davi de Castro/Jornal de Hoje
Os vendedores de salgadinhos sobre bicicletas, uma das novidades comerciais do calçadão, chamaram a atenção da imprensa no dia da apreensão feita por Quinzão. Vídeos viralizaram nas redes sociais mostrando a revolta da população. O agente se defende. “Avisamos três vezes que não podia vender aquela mercadoria em frente ao Bobs, onde ele estava”, justifica. O jovem, identificado como Tiago, chegou a receber do superintendente de posturas, Marcio Marques (na terça-feira), um crachá autorizativo para trabalhar no dia seguinte. “Meia hora depois ele estava no mesmo local, com o crachá no pescoço, numa afronta a todos. Por isso a autorização foi retirada”, disse Quinzão.
Pedindo para não serem identificados, os ambulantes de bicicleta pedem para “trabalhar em paz”. Marcio Marques disse que todos estão liberados, exceto no calçadão ou estabelecimentos que tenham os mesmos produtos. O Jornal de Hoje apurou que nos próximos 15 dias haverá cadastramento para Miguel Couto, Comendador Soares e Austin.
Mercado a céu aberto
A bagunça no uso do solo público não está somente no Calçadão da Amaral Peixoto. O Código de Posturas proíbe venda de produtos iguais ao dos supermercados, a menos de 100 metros de suas redes. Como também ambulantes a menos de 50 metros uns dos outros. Mas ninguém inibe essa prática. Na Rua Governador Portela, próximo a Coronel Francisco Soares, por exemplo, são vendidas as mais variadas mercadorias, desde hortifrutigranjeiros, ferramentas, venenos contra rato, roupas, iogurtes, queijos, calçados, biscoitos, carnes, linguiças e vários produtos de laticínios, como um verdadeiro “mercado a céu aberto”. Isso tudo a poucos metros de um supermercado e outros estabelecimentos onde são encontrados os mesmos produtos.
O bar do barulho

Fotos: Davi de Castro/Jornal de Hoje
Ainda na Rua Governador Portela, entre os números 1.046 a 1.076, o forró “come solto” a noite toda no “Bar do Hermes”. O barulho incomoda a vizinhança, contrariando o artigo 72 do Código de Posturas. As reclamações já foram feitas à prefeitura, polícia, defesa civil e outros órgãos. Mas, segundo moradores da região, providências nunca foram tomadas. “É muito barulho e a gente não consegue dormir”, disse Jaime Soares, 70 anos, morador da Santa Luzia. “É uma bagunça que não deixa a gente dormir, pois a música é muito alta”, concorda José de Freitas, 83. “O barulho vai até as 4h da manhã”, confirma Celso Monteiro, outro morador da área.
O governo sabe
Quando o assunto é bagunça, propina, camelôs e Calçadão de Nova Iguaçu, as pessoas têm medo de falar. Outras, falam desde que sejam mantidas no anonimato. “Esse assuntos já levaram muita gente para debaixo dos sete palmos (morte)”, disse um comerciante. “Nada aqui acontece sem a conivência do governante maior”, completou. “Não acredito que o prefeito, seja ele quem for (evitando falar o nome de Rogerio Lisboa), não saiba como funciona isso aqui. Na campanha, fazem reuniões e promessas aqui. Depois, ó… (o comerciante aponta o dedo indicador para o bolso e ri)”.
Outro comerciante revoltado com a bagunça nas ruas centrais disse que “não acredita em mudança para melhor”. E justifica: “Quando o prefeito era aquele rapaz do PT (Lindberg Farias, atual senador) o Rogerio tinha uns amigos que cuidavam aqui do calçadão. Então, ele sabe como funciona isso aqui. Mas só muda se tiver organização e autoridade”, duvida.
Mercado Popular

Fotos: Davi de Castro/Jornal de Hoje
Ao se falar de promessa, o presidente do Sindicato dos Vendedores de Rua de Nova Iguaçu e Belford Roxo, André da Silva, 77 anos, lembrou ontem da que fez o então candidato a prefeito Rogerio Lisboa, durante a campanha eleitoral. “Ele prometeu que não iria remover os vendedores da Praça Maria Eunice (antiga José Hipólito de Oliveira, conhecida como camelódromo)”, disse.
Porém, ao lado há o Mercado Popular Central de Nova Iguaçu, com 259 boxes, ambiente totalmente climatizado. Mas, em virtude de uma pendenga jurídica, o espaço está se deteriorando, inclusive os gigantescos aparelhos de ar condicionado de 83 mil BTUs. “Os vendedores também não querem ir pra lá. São 259 boxes apenas, para 317 deles. Sendo assim, 58 famílias ficariam fora”, revela André. Convocado para uma reunião com o setor de posturas, possivelmente hoje, ele sonha em chegar até o prefeito para tratar desse assunto. Mas a conversa será para recuar as barracas que estão no meio da Avenida Nilo Peçanha.
por Davi de Castro – davi.castro@jornalhoje.inf.br