
Pela primeira vez na história, mulheres negras vão marchar até Brasília em protesto contra o racismo, a violência, a intolerância religiosa e as más condições de vida que enfrentam ao longo desses 515 anos de Brasil. A Marcha Nacional das Mulheres Negras acontece hoje, a partir das 8h30, na Praça dos Três Poderes. Segundo a Coordenação Estadual do Rio de Janeiro, cerca de três mil mulheres seguiram para a capital do País, lutando pelo direito das 54,9 milhões espalhadas por todo o país.Do Rio, partiram 23 ônibus, sendo oito da Baixada Fluminense.
Na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada em 2014 pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), apontou que 54,9 milhões de brasileiras se autodeclaram pretas ou pardas. Para a organização da Marcha Nacional, a intenção do ato é unir o máximo de organizações de mulheres negras. “Trata-se de uma iniciativa de articular as mulheres negras brasileiras. A intenção é aglutinar o máximo de organizações de mulheres negras, assim como outras organizações do Movimento Negro, sem dispensar o apoio de organizações de mulheres e de todo tipo de organização que apoiem a equidade sociorracial e de gênero”, declarou o Comitê Impulsor Nacional, organizador do evento.
Nos oito onibus da Baixada Fluminense estão representantes das cidades de Duque de Caxias, Guapimirim, Magé, Nova Iguaçu, Mesquita, Queimados, Belford Roxo e São João de Meriti. Ainda conforme organizadores, a Marcha comprova o interesse das mulheres em causas de gênero. “Essa é mais uma demonstração de protagonismo feminismo, em tempos de campanhas como #oprimeiroassédio e #agoraéquesãoelas, da persistente violência de gênero como tema da redação do Enem, de atos e caminhadas contra a ameaça aos direitos femininos patrocinada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e seu séquito conservador”, publicou o Comitê. “Marcharemos em homenagem às nossas ancestrais e em defesa da cidadania plena das mulheres negras brasileiras”, divulgou o comitê.
A programação para a Marcha começou na última segunda-feira (16) com palestras abordando a temática “Mulher Negra no Brasil” em diferentes pontos da cidade de Brasília. Hoje, no Ginásio Nilson Nelson, está marcado para 8h30 a concentração da Marcha Nacional das Mulheres Negras. Já às 9h30, tem inicio a Marcha, que irá seguir até o Eixo Monumental, Museu da República, passando pelo Congresso Nacional e encerrando no mesmo local do ponto de partida. Entre 13h e 17h, acontece o encerramento com o show “Mulheres Negras Pelo Bem Viver”.
Público Alvo
Dar maior visibilidade a situação de opressão secular da mulher negra, homenagear nossas ancestrais e exigir do Estado brasileiro. Esse é um pontos que a Marcha quer abordar. Segundo a organização do evento, a Marcha tem o interesse de mobilizar um público diversificado. “Temos interesse especial em mobilizar: meninas negras, adolescentes e jovens negras, do campo e das cidades; negras enfermeiras, negras professoras, negras empregadas domésticas, negras quilombolas, negras das manifestações e danças tradicionais (carimbo, marabaixo, maracatu, tambor de crioula, jongo e outras), negras do samba (sambistas, passistas, portas-bandeiras), negras prostitutas, negras médicas, negras ligadas às religiões de matrizes africanas (candomblé, mina, quimbanda, umbanda, pena-maracá e outras), negras cujos filhos/as foram assassinados pela polícia, negras lavadeiras, negras cozinheiras, negras da construção civil, negras cristãs (católicas, anglicanas, presbiterianas, batistas, testemunha de Jeová, assembleianas, dentre outras),negras bahaistas, negras nerds, negras punks, negras emos, negras desportista, negras artistas, negras atéias, negras portadoras de deficiência, negras regueiras, negras rapers, negras funkeiras, negras DJs, negras grafiteiras, negras garis, negras empresárias, negras que conseguiram cursar o terceiro grau, negras cujos parentes foram assassinados nos episódios do Carandiru, Candelária, Vigário Geral, Eldorado dos Carajás e outros massacres, negras lésbicas, negras bissexuais, negras transsexuais, negras modelos fashions, negras sem terra, negras atingidas por barragens, negras sem teto, negras-indígenas, negras ribeirinhas, negras extrativistas, negras não alfabetizadas; negras que foram mal atendidas no sistema de saúde). Ou seja, todas as mulheres negras, inclusive, e principalmente, as quem foram e/ou estão sendo discriminadas por vizinhos, por médicos, dentistas e outros, mas que têm se sentido impotente diante de tão grande opressão”, informou os organizadores do evento na página da Marcha na internet.
Mapa da Violência 2015
A Marcha das Mulheres Negras 2015 acontece no âmbito da Década Internacional dos Afrodescendentes (2015-2024), declarada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e no mês da Consciência Negra. No início da semana passada, a ONU, a Organização Pan-Americana da Saúde da Organização Mundial da Saúde (Opas/OMS), Secretaria de Políticas para Mulheres e Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) tornaram público o “Mapa da violência 2015 — Homicídios de mulheres no Brasil”. O documento mostra que desde 2008, o feminicídio é crescente. O último levantamento, feito em 2013, mostra que 4.762 mulheres foram assassinadas. São 13 mortes por dia, o que faz do Brasil um dos cinco países com as maiores taxas de homicídios femininos (4,8 por cem mil habitantes).