
O Brasil é oficialmente um Estado laico, pois a Constituição Brasileira e outras legislações preveem a liberdade de crença religiosa aos cidadãos, além de proteção e respeito às manifestações religiosas. Para defender esta máxima, a população tem encontro marcado neste domingo (21), às 10h, no bairro Vila da Penha, Zona Norte do Rio. No local, será realizada uma passeata e a cor branca, usada pelos praticantes do candomblé e da umbanda, que também é a cor da paz, será usada como símbolo contra a intolerância religiosa. A ação tem a finalidade de chamar a atenção da sociedade para a agressão sofrida pela menina K. de apenas 11 anos, que foi atingida na cabeça por uma pedra, atirada, segundo testemunhas, por um grupo de evangélicos no domingo, dia 14.
“Ela estava andando com um grupo de pessoas e um grupo de evangélicos, que estava do outro lado da rua, começou a demonizá-los e a xingá-los. Não se contentando com isso, jogaram uma pedra”, disse o babalaô dos Santos, da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa. Segundo ele, a família contou que os agressores “estavam arrumados”, tinham bíblias e acusaram os praticantes de candomblé de serem “demoníacos”.
O babalaô pediu que líderes evangélicos venham a público repudiar a agressão e colaborem com as investigações. “Isso é ruim para uma religião. Eu sei que a grande maioria dos evangélicos não é assim, e cabe a eles ajudar a identificar esses agressores. Eram pessoas da igreja, pessoas que estavam com bíblia.”
O caso foi registrado ontem na 38ª DP (Brás de Pina) como lesão corporal e no artigo 20 da lei 7.716 (praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de religião). A polícia tenta identificar os agressores através de câmeras dos ônibus da região.
K. chegou a desmaiar e, segundo seus parentes, teve dificuldade para lembrar de fatos recentes. “Ela está bem, pois foi socorrida e até foi à escola, pois é muito estudiosa. Mas na hora chegou a perder a memória. Que mundo é esse que estamos vivendo? Não se respeita nem criança?”, questionou, Yara Jambeiro, 49, integrante do Barracão Inzo Ria Lembáum e uma das responsáveis pela educação religiosa de K.
Apesar de o estado do Rio ter a maior proporção de praticantes de religiões afro-brasileiras (1,61%), segundo levantamento da Fundação Getulio Vargas com base no Censo 2010, o estado também liderou as denúncias de discriminação religiosa em 2014, como mostra levantamento da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH). Foram 39 ligações para o Disque 100 denunciando a intolerância. São Paulo, em segundo lugar no ranking, contabilizou 29 casos.
A professora aposentada da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Denise Fonseca, que coordenou pesquisa sobre templos de religiões de matriz africana, acredita que por trás das agressões aos praticantes de candomblé e umbanda está a necessidade de religiões neopentecostais criarem um inimigo a ser combatido, para depois cooptar fiéis.
“Há um projeto de aliciamento de pessoas em estado de vulnerabilidade emocional ou material [por neopentecostais]”, disse. “Ao satanizar e trazer para dentro de suas igrejas, oferecendo o que chamam de ‘libertação’ nada mais estão fazendo do que roubando adeptos”, completou.
Na pesquisa, entre 2008 e 2011, foram mapeados 900 templos religiosos de matriz africana no Rio e 450 queixas de intolerância. “São casos que começam com agressões verbais – ‘filha do demônio’ e ‘vai para o inferno’, ou seja, uma satanização – e passam por agressões às casas religiosas, com pichações e depredações e até agressões físicas”, revelou.
Médium é encontrado morto
O presidente do Lar de Frei Luiz, Wilson Vasconcelos Pinto, disse que a casa não tem qualquer suspeito para a morte do médium Gilberto Ribeiro Arruda, de 73 anos, e que a vítima morava no local com a mulher, Marli, mas que eles dormiam em quartos separados.
Pinto disse ainda que foi a mulher do médium quem encontrou o corpo do marido, por volta das 7 horas da manhã de ontem. Segundo ele, Gilberto participou de uma reunião na noite quinta-feira com dependentes químicos e que não teve qualquer tipo de problema. Esse encontro é realizado há mais de 4 anos. “Ele era o principal médium da casa. Uma pessoa tranquila e estamos todos chocados com o que aconteceu”. Perguntado se teria alguma ligação com crime de intolerância religiosa, o presidente da instituição, descartou totalmente essa hipótese.
O vice-presidente do Lar de Frei Luiz e diretor espiritual da casa, Nélson Duarte, disse que o médium Gilberto Arruda foi encontrado deitado no chão. “Ele era uma pessoa muito boa. Uma pessoa que serve a casa há 68 anos fez caridade com a mediunidade de cura. São milhares de pessoas beneficiadas. Quem é que pode imaginar dele ter uma inimizade? Para nós. é uma surpresa grande saber que ele teve inimigo ou que supostamente existe inimigo. Então, a gente descarta isso”, explicou.
O Lar de Frei Luiz distribuiu nota oficial sobre a morte do médium Gilberto Ribeiro Arruda, 73 anos, encontrado amarrado no quarto onde dormia e com golpes no rosto e um corte no braço. Médium desde os 6 anos de idade, “dedicou-se durante toda a vida aos necessitados e sofredores com a sua mediunidade de cura”.
O documento assinado pelo presidente do Lar de Frei Luiz, Wilson Vasconcelos Pinto, informa que os fatos sobre a desencarnação do médium Gilberto estão sendo apurados, e somente após a conclusão das investigações “poderemos saber o que de fato ocorreu”.