Assédio sexual: violência de gênero e relações de poder

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O tema de hoje é sobre assédio sexual e moral, especialmente nos aspectos jurídicos. Apesar de teoricamente o crime poder ser praticado tanto por homens quanto por mulheres, e de existirem notícias de assédio de mulheres para com os subordinados, a grande maioria dos cargos de chefia ainda é ocupada por homens, e a grande maioria das vítimas de assédio ainda são mulheres.
Em Terra Fria (North Country), Charlize Theron dá vida à personagem Josey, uma mulher que depois de abandonar o marido, que a agride, volta a viver com os pais. Para receber um salário melhor que o de cabeleireira, na cidade onde tudo gira em torno da mineração, ela decide trabalhar também nas minas, e sofre, juntamente com as outras mulheres, o assédio moral e sexual dos colegas de trabalho e mesmo dos conterrâneos.

Afinal, o que é “assédio sexual”?

Assédio sexual é toda tentativa, por parte do superior hierárquico (chefe), ou de quem detenha poder hierárquico sobre o subordinado, de obter dele favores sexuais por meio de condutas reprováveis, indesejáveis e rejeitáveis, com o uso do poder que detém, como forma de ameaça e condição de continuidade no emprego. Pode ser definido, também, como quaisquer outras manifestações agressivas de índole sexual com o intuito de prejudicar a atividade laboral da vítima, por parte de qualquer pessoa que faça parte do quadro funcional, independentemente do uso do poder hierárquico. Cartilha do Ministério da Saúde – 2008

Para se caracterizar o assédio sexual, são necessários alguns requisitos, que são “elementares do tipo penal”. Pensemos no crime como um quebra-cabeça, que só se completa com todas as peças. As peças, as vezes minúsculas e difíceis de encaixar, chamamos “elementar” do tipo — sendo “tipo” um dos três elementos básicos do que comumente se chama “crime”. O tipo penal é a descrição da conduta, da ação. Para se configurar um crime é preciso que inocorram as excludentes de ilicitude, legítima defesa, por exemplo. E que estejam presentes as condições de culpabilidade — pessoa maior, capaz de entender o caráter ilícito/ilegal da conduta e capaz de agir de acordo. Complicado, mas tem que ser, porque senão TUDO seria crime. E, na verdade, há um princípio de que o Direito Penal é a ultima ratio, ou seja, a última opção — ao contrário do que a mídia em geral prega, de criminalizar toda e qualquer conduta.
Caracterizam o assédio sexual três pontos principais:

1) constrangimento ilícito, como compelir algo contra a vontade da vítima;
2) finalidade especial, qual seja, favorecimento sexual;
3) abuso de uma posição de superioridade laboral.
Para caracterizar o crime é preciso que o assediador seja superior hierárquico. Então, entre professor e aluno, por exemplo, não havendo superioridade hierárquica laboral, decorrente de vínculo de trabalho, não cabe a caracterização do crime. Cabem outros crimes? Com certeza, mas não o previsto no artigo 216-A do Código Penal.
A seara criminal não é a única opção, pelo contrário, deveria ser a última em alguns casos. Então, caberá sim, a proteção do direito administrativo e trabalhista nas relações de trabalho e, o direito civil amparando com indenizações as vítimas de assédio moral e sexual. Infelizmente, nossas tradições nos casos de indenização ainda são de indenizações compensatórias.
Em uma crônica que gerou muita polêmica na rede, em 2008, o colunista da Trip escreveu a “Carta aberta para Luísa”, que relata um fato ocorrido na sua adolescência, em que ele e um amigo teriam estuprado a empregada da casa. Depois da polêmica, foi publicado um pedido de desculpas e uma negativa da realidade do fato. Tudo seria uma obra de ficção. Ficção ou não, o fato é que empregadas domésticas, um nicho trabalhista que carrega tantas conotações de subalternidade e paternalismo, ocupado majoritariamente por mulheres, em sua maioria negras, a figura do assédio ainda é comum e não denunciado.
Em 2010, uma empregadora foi condenada a pagar a indenização pelo assédio sexual praticado pelo marido, contra a empregada doméstica. A notícia foi comentada num portal jurídico, observem a ressalva quanto ao “enriquecimento com indenizações excessivas”:
A quantificação do dano moral, por sua vez, é assunto complexo por não haver valor legal fixado e, assim, depender da análise de variáveis como grau de culpa e poder econômico do ofensor, bem com, extensão do dano e sua repercussão social. Esse sistema aberto para aferição do valor considera o caso concreto, abastecido com todas as nuances humanas que o dano moral, especialmente, carrega. Portanto, obriga o magistrado a exercitar um olhar específico que, ao mesmo tempo em que deverá reparar o direito lesionado da vítima, não deverá fomentar riqueza ilícita com indenizações excessivas.

No fim de 2010, foi publicada uma portaria interministerial, entre o Ministério da Justiça e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. (SEDH/MJ nº 2, de 15 de dezembro 2010). Em tal ato normativo, com valor imediato para os órgãos subordinados aos ministérios elaboradores, se busca estabelecer Diretrizes Nacionais de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos dos Profissionais de Segurança Pública.

No caso, apenas as Polícias Federal e Rodoviária Federal estão diretamente subordinadas. Polícias Civil e Militar são subordinadas aos Estados, e GMC subordinadas aos Municípios, logo, é preciso que uma norma estadual e/ou municipal regulamente tais diretrizes.
Pesquisas recentes demonstram que uma em cada quatro mulheres já sofreu assédio sexual no trabalho. O que se pode dizer é que nesses casos, como em vários outros casos, quase toda mulher tem uma história de horror para contar.

Ainda há a violência moral, aquela que é mais ou menos sutil e, que coloca a carga da culpa sobre a vítima. Muitas pessoas acham que a ascensão feminina no mercado de trabalho é fruto dos famosos “testes do sofá”. Não basta se mulher e competente, a competência passa pelo uso do poder sexual.

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