Por Arnaldo Bittencourt
Fotos: Marcus Lauria
No último artigo que escrevi sobre carro elétrico no Brasil ressaltei que os carros elétricos ainda não tinham se popularizado em função do preço de aquisição. As vantagens dos elétricos em relação aos carros à combustão são evidentes: exigem menos manutenção, o custo por quilometro rodado é menor, não emitem gases poluentes.
CONFIRA O VÍDEO: https://www.youtube.com/watch?v=dX7D-ZxZVTQ&t=40s

Já os carros híbridos, que são aqueles que trazem motores à combustão e elétrico, conseguiram alcançar certa popularidade, prometendo grandes avanços em autonomia e emissão de poluentes. De maneira geral, funcionam assim: o motor elétrico sustenta o carro em baixa velocidade. O motor à combustão entra em ação quando o motorista exige mais desempenho ou quando o sistema do carro entende que é necessário. A grande vantagem dos híbridos é que não exigem paradas em eletropostos, pois quem recarrega a bateria do motor elétrico é o motor à combustão.
No universo dos híbridos os dois tipos mais comuns do país são: os “HEV” ou “full-hybrids”, que não se conectam a carregadores e os “PHEV” ou “plugin-hybrids”, que demandam conexão a um recarregador. Os primeiros são bem eficientes e estão substituindo os veículos à diesel, como se vê atualmente na Europa. Já o segundo tipo tem uma particularidade… se não forem recarregados no carregador, começam a gastar mais combustível do que um carro 100% à combustão, pois vai usam o motor a combustão para recarregar o motor elétrico!

As marcas chinesas são responsáveis pela mudança no mercado nacional de carros 100% elétricos. Com a chegada dos produtos chineses, o mercado todo teve que ajustar os preços (para menos, felizmente!). O Kwid elétrico, por exemplo, teve o seu preço reduzido para menos de R$100 mil (custava R$150 quando avaliei o carro).
O teste da vez é do Fiat 500e Icon, versão 2022. Existe um modelo novo lançado em 2024, mas esse ainda não veio para o Brasil. O preço dele, infelizmente, segue alto (R$215 mil). Dada a nova realidade do mercado, acredito que a FIAT precisará rever o preço deste produto, ou então tirá-lo de linha. Penso que a segunda opção é a mais provável.

Destaco que minha experiência com ele foi muito boa. Como todo elétrico, ele despeja 100% do torque (22.4kgfm) de forma imediata, se o motorista afundar o pé no acelerador. Isso garante ao 500e acelerações bem vigorosas, que deixam qualquer carro para trás nas saídas de semáforo.
Pesando 1.298kg, o 0-100 do 500e fica na casa dos 9 segundos. Nada mal para um pequeno carro com vocação urbana.
A suspensão dele é boa e absorve bem a imperfeições do asfalto. Os pneus 195/55R16 ajudam na absorção dos impactos, sem prejudicar a estabilidade. O centro de gravidade do carro também é muito baixo, pois um dos maiores pesos do carro (a bateria) fica rente ao solo. A diversão com o 500e em uma estradinha sinuosa é, portanto, garantida!

Por falar em bateria rente ao solo, é importante esclarecer que é FAKE aquele vídeo do 500e que andou circulando na internet que supostamente mostra uma unidade do 500e que teve perda total declarada em função de um impacto no componente após passar em um quebra-molas. A bateria fica em uma área protegida, dificilmente uma raspada em um quebra-molas poderá danificá-la. Um detalhe muito bacana do 500e é o sistema que permite guiar o carro usando apenas um pedal. Esse sistema realiza um GRANDE SONHO meu de nunca precisar apertar o freio.
Pois é, com o 500e o motorista raramente usa o freio. Para o sistema funcionar, o carro precisa estar no modo de condução RANGE, que proporciona economia média de bateria, sendo este o modo de condução que achei mais interessante. Ao acelerar, o carro anda. Ao aliviar a pressão no acelerador, ele freia, chegando a frear vigorosamente se você soltar o pedal de uma vez só. O ideal é ir soltando aos poucos, de modo a manter a condução suave.

Descrevendo assim parece complicado, mas não é… Me adaptei rapidamente ao sistema e virei fã do recurso. Quando o carro freia dessa forma, ele recarrega a bateria. Cheguei a fazer a bateria subir 1% em um deslocamento de 10km, ao invés dela reduzir o percentual de recarga. É isso mesmo, o sistema é fascinante em todos os sentidos. Por galar em modo de condução, além do RANGE, o 500e oferece o modo SHERPA. Isso mesmo, igual aos mestres das escaladas do Himalaia. Esse modo proporciona economia máxima, desativando até o ar-condicionado e a multimidia, que felizmente podem ser religados se assim desejar o motorista.
Há ainda o modo de condução é o NORMAL, que deixa o carro mais solto e demanda o uso do freio para reduzir a velocidade. Há também o modo TURTLE, mas esse modo só entra em ação quando a bateria está em um nível extremamente baixo. A ideia é reduzir o consumo da bateria a um mínimo, permitindo que o veículo se desloque lentamente até o eletroposto mais próximo. É um modo de condução emergencial, não agradável de ser usado, que tentar evitar a “pane seca”.

Destaco uma característica do 500e que causa grande controvérsia no meio automotivo atual, principalmente no universo dos influenciadores digitais: o freio traseiro do 500e é a tambor! Vixe Maria, agora a FIAT pegou pesado, como um carro de R$215 mil tem freio a tambor na traseira!
Quem fala isso provavelmente nunca dirigiu um elétrico na vida… Carro elétrico exige pouquíssimo dos freios. Há histórias de pastilhas dianteiras de freio durando mais de 100 mil kms. Acreditem, não são lendas ou histórias de pescador, os carros elétricos realmente não demanda muito do sistema de freios do carro por conta dessa lógica de recarga nas desacelerações.

E a autonomia do 500e, como é? Bom, não tentaria andar mais do que 200kms com esse carro na cidade. Na estrada, o consumo do elétrico é ainda maior, então não programaria viagens superiores a 120-150km com esse carro. O computador de bordo marca 220-230km de autonomia após uma recarga total, mas esse número varia bastante, de acordo com o seu estilo de condução.
Para conseguir uma boa autonomia, é fundamental usar o modo de condução RANGE. No modo NORMAL, a autonomia cai bastante. O SHERPA é um exagero, corta muita coisa e deixa o carro ruim de guiar. Por isso repito: o RANGE está de bom tamanho, é o modo de condução mais equilibrado.

Externamente, o visual do carro agrada bastante e chama muita atenção na rua, principalmente de crianças. Os faróis são em full led, incluindo o DRL e um exclusivo repetidor de seta localizado na lateral do capô. A traseira também traz lanternas e setas em led. O teto panorâmico incrementa bastante o visual do modelo, dando um ar luxuoso e futurista ao carro. As rodas aro 16 escurecidas contrastam lindamente com a cor clara da carroceria (o carro testado era branco).
Internamente o 500e chama a atenção pela excelente qualidade dos materiais. Ao entrar no carro, você sente aquele perfume de couro de qualidade, grosso, que não vai durar muitos anos, mesmo com pouca manutenção. O volante tem ótima empunhadura e a forração em couro também esbanja qualidade. Muito macia e bonita.

O painel de instrumentos é 100% digital, com boa resolução e de fácil leitura, permitindo a exibição do sistema de navegação embutido na central multimidia do carro. Por falar na central, ela tem um bom tamanho e a tela retangular de 10.25” oferece ótima resolução. É compatível com Android Auto e Apple CarPlay sem fio, o que é ponto extremamente positivo.
Há um carregador por indução logo abaixo da central, que permite o recarregamento do telefone durante o uso desses sistemas operacionais automotivos integrados ao OS do celular. O sistema de som do carro, apesar de não ser assinado por nenhuma marca famosa, oferece uma qualidade sonora muito boa.

O espaço interno é bom para quem senta na frente. Há uma sensação geral de amplitude, muito por conta do teto panorâmico (que não abre na versão testada). No banco traseiro cabem duas pessoas, mas fica um pouco apertado, principalmente se forem maiores do que 1,80m. O porta-malas é bem diminuto: 180L. Considerando que a proposta do carro é urbana, não entendo apropriado criticar o 500e por este motivo.
O botão interno de abertura das portas é elétrico. Após apartar o botão, as portas podem ser abertas pelos passageiros. O efeito é interessante, estranhei no início, mas depois me acostumei. Em termos de segurança, o carro tem 6 airbags (frontais, laterais e cortina). Há também auxiliar de frenagem de emergência, piloto automático adaptativo (aquele que consegue parar o carro totalmente e depois faz o carro andar de novo), além do auxiliar de manutenção em faixa (que soa alarme e vira o volante para manter o carro na faixa) e auxiliar de ponto cego nos retrovisores (que não rebatem automaticamente).

Andando na cidade não tive problemas para recarregar o 500e. Encontrei carregadores nos supermercados, nos shoppings (alguns gratuitos) e até mesmo em alguns postos de gasolina do Rio de Janeiro. Claro que quem compra um elétrico precisa ter um carregador em casa ou no trabalho, pois ter que sair para recarregar o carro é muito chato. Uma recarga em um carro como o 500e pode, facilmente, levar mais de 2h30min. E a situação complica se, ao chegar no ponto de recarga, você descobre que tem gente usando ou está quebrado. De qualquer forma, hoje em dia é totalmente possível usar um carro elétrico nos seus deslocamentos urbanos do dia a dia. E quem mora no campo e tem painel solar em casa pode se beneficiar ainda mais com as recargas “gratuitas”.
Tentei carregar na garagem do meu prédio, usando o carregador de emergência que vem com o modelo. Impraticável… Em uma tomada comum de 110v, o carro indicou 48 para carregar 30% da bateria. Esse teste, em particular, só serviu para criar confusão com meus vizinhos, pois não gostaram de ver o carro conectado a uma tomada na garagem, que entrega uma energia paga por todos os condôminos. Mais um motivo para ter um carregador dedicado, conectado diretamente ao seu relógio ou a um relógio cuja conta é repartida entre os usuários de carro elétrico.

Na estrada, a situação de um carro 100% elétrico complica consideravelmente. Os pontos de recarga são poucos e não é agradável ficar esperando o carro recarregar para poder seguir viagem. Por isso repito: carro 100% elétrico é adequado para o uso urbano. Quando o deslocamento envolve estrada, esquece… Ou seja, se for viajar, recomendo que alugue um híbrido ou um modelo só a combustão.
Penso que não faz sentido comparar o 500e à concorrência, pois o seu o preço está desatualizado. Existem hoje no mercado carros que oferecem uma autonomia bem maior por um preço bastante inferior, e com um interior de excelente qualidade, cheios de recursos tecnológicos e desempenho superior. Sim, estou pensando no BYD Dolphin e no GWM Ora, que inclusive oferecem mais espaço interno do que o 500e. Em tamanho, o modelo da Fiat é comparável ao BYD Dolphin Mini, ainda mais barato.

Enfim… Se a FIAT não ajustar o preço, não vejo alternativa a não ser tirar o modelo de linha. Pensando bem, acho que nunca vi outro Fiat 500e nas ruas do Rio de Janeiro… se vi e não lembro, provavelmente era outra unidade de imprensa, ou então alguém que alugou por uma unidade por tempo determinado, para matar a curiosidade.
Em função do alto preço, dificilmente alguém levará um 500e para casa. Seria uma pena a FIAT deixar de comercializar o Fiat 500e no Brasil, pois o modelo é bom de guiar, cheio de charme e esbanja um estilo ímpar, além da indiscutível tradição do nome 500, um modelo desenvolvido para atender as necessidades das famílias italianas menos abastadas do período pós-segunda guerra mundial.

*FICHA TÉCNICA:
Combustível Híbrido / Elétrico
Potência (cv) 118
Torque (kgf.m) 22,4
Velocidade Máxima (km/h) 150
Tempo 0-100 (s) 9
Câmbio automática
Tração dianteira
Direção elétrica
Suspensão dianteira Suspensão tipo McPherson e dianteira com barra estabilizadora, roda tipo independente e molas helicoidal.
Suspensão traseira Suspensão tipo eixo de torção e traseira com barra estabilizadora, roda tipo semi-independente e molas helicoidal.
Dimensões
Altura (mm) 1.527
Largura (mm) 1.683
Comprimento (mm) 3.632
Peso (Kg) 1.290
Tanque (L) N/D
Entre-eixos (mm) 2.322
Porta-Malas (L) 185
Ocupantes 4
*Dados do fabricante