Manifestação de ambulantes pode barrar mais de 500 ônibus em Nova Iguaçu

Os trabalhadores solicitaram uma reunião com dirigentes da Ponte Coberta, em Edson Passos, mas não foram atendidos
Davi de Castro/Jornal de Hoje

Mais de 500 ônibus poderão ser impedidos de trafegar pelo corredor da Avenida Abílio Augusto Távora (antiga Estrada de Madureira). Ambulantes ameaçam fechar um dos pontos estratégicos da via, a qualquer dia e hora desta semana, em protesto à proibição da venda de produtos no interior dos coletivos. A manifestação tem apoio de comunidades situadas às margens da Estrada de Madureira, onde moraram dezenas de famílias sustentadas pelos ambulantes.
A proibição de entrar nos ônibus começou no final do ano passado e se tornou mais rigorosa a partir de fevereiro deste ano. Em busca de um possível acordo com a direção da viação Ponte Coberta, vários ambulantes compareceram na segunda-feira (19) à garagem da empresa, em Edson Passos, Mesquita. Permaneceram quatro horas de pé, no sol de 36 graus, em frente ao portão e não foram recebidos. Ao sair de lá, iniciaram a mobilização para o protesto, com a presença da imprensa.
Dona Cristina Farias de Oliveira, 54 anos, disse ao Jornal de Hoje que depende do trabalho de vendedora ambulante para manter a família. “Comecei aqui – na Rua Bernardino de Mello, ao lado da estação ferroviária – aos 14 anos de idade. Também trouxe os meus filhos para aprender trabalhar como camelô. Ensinei a eles o bom caminho do trabalho, para aprender não botar a mão naquilo que é dos outros. Estão aqui desde pequenos. Eu trazia eles e botava numa caixa. Depois comprei um carrinho”, revela.
Com a pele queimada e castigada pelo sol do dia a dia, vendendo doces, balas, pipocas, água e refrigerante há 40 anos no mesmo local, ela exibe como troféu, um dos seus filhos, o Alexandre, de 33 anos. “Estou aqui desde criança, sou casado, tenho mulher e dois filhos, sendo um de 13 anos e uma menina de nove anos. É daqui que tiro o sustento da minha família”, diz.

Passageiros defendem ambulantes

Saulo não pode entrar no veículo para vender doces sem pagar a tarifa
Davi de Castro/Jornal de Hoje

Assim como todos os outros ambulantes que trabalham nos pontos de ônibus existentes no corredor Estrada de Madureira, dona Cristina e sua família também estão proibidas de entrar nos ônibus da empresa Ponte Coberta, Glória ou qualquer outra que faça parte do grupo empresarial, para vender seus produtos. “É bom quando eles entram no veículo. Muitas vezes a gente está com fome ou sede. Ou bebe água, refrigerante ou como um doce ou uma pipoca. A gente pode comprar pela janela, mas quando o ônibus está cheio, comprar pela janela torna-se impossível”, disse a dona de casa Maria Celeste, 57 anos, que trafegava em um Ponte Coberta, com destino a Campo Grande. “Os ambulantes são um quebra galho de quem tem fome ou sede. Proibir eles de entrar no ônibus é uma desumanidade com eles e com quem precisa deles”, dispara a estudante Camila Louras, 21 anos.

Eles querem acordo com empresas

O ambulante Edson Franklin, 39 anos, dos quais 20 só trabalhando em ônibus, é mais um pai de família triste com a decisão do Grupo Ponte Coberta. “Eles querem que a gente pague a passagem ao entrar no ônibus. Ora, nós entramos em mais de 100 veículos por dia ou mais. Não há dinheiro para isso. Só queremos trabalhar honestamente e aceitamos negociar um acordo”, diz. Com ele fazem coro outros vendedores na Estrada de Madureira, próximo à Universidade Iguaçu. Cristiano Alves de Oliveira, 31 anos, há 10 anos trabalha no mesmo setor, assim como Renata Ribeiro Ventura, 29 anos, Jefferson Garcia, 34, e o limpo e cheiroso Saulo de Freitas, 28 anos. ”Cuido da imagem, afinal, sou vendedor ambulante”, explica-se. Eles vendem doces, balas, pipocas, água, biscoitos e refrigerantes. Todos têm família para sustentar. “O que a gente faz aqui é melhor do que roubar”, define Renata.
Se a manifestação acontecer, com ato de protesto para impedir o acesso de veículos da Ponte Coberta ou de outra do grupo empresarial, como a Glória, mais de 500 ônibus poderão ser impedidos de trafegar pela Estrada de Madureira, a qualquer momento.

Motoristas não podem ajudar

Motoristas de ônibus disseram ao Jornal de Hoje que se sentem com “o coração cortado”, ao não permitir que os ambulantes vendam seus produtos no interior dos veículos. “Nós, motoristas, conhecemos todos eles e sabemos que são pais de família que, desse trabalho, tiram o sustento da mulher e filhos, ou até dos pais que estão muito idosos”, disse um deles. “Mas se a gente for flagrado pelas câmeras instaladas no veículo, a gente pode pegar um, dois ou três dias de gancho (suspensão). E ainda perder o direito à cesta básica. Sabe o que é isso? Isso é um prejuízo de mais de R$ 500 no nosso salário. Por isso, não podemos fazer nada por eles”, diz outro motorista.

por Davi de Castro – davi.castro@jornalhoje.inf.br

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